quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Um homem sujo

Alguns, quando me vêem de longe, logo bradam: “eis um homem sujo!”. E é verdade, a sujeira me acompanha. E não é porque tomo pouco banho e não uso sabonetes e outras parafernálias perfumadorescas. Ou, pelo menos, não só por isso. Mostre-me algumas virtudes morais e logo revelarei a imundice por detrás. Apresente suas riquezas e lhe indicarei a fedentina do dinheiro. Defenda uma bandeira política popular e desnudarei a bosta que está envolvida. Sou assim, não sou de deixar sujeira para trás, abandonada no esquecimento dos homens, carrego-a para toda conversa. Alguns indagarão, mas por que carregar a sujeira da humanidade, tão pesado fardo, ainda mais sozinho? Ora, alguém tem que fazer o trabalho sujo e remexer na fedentina da vida humana, não para perfumá-la, como é comum ocorrer, mas para higienizá-la nas mentes. E dado que a natureza me deu uma narina apurada e um intestino solto, passo os dias a aspirar à estupidez de quase tudo e a evacuar as merdas que digo a todo o momento.

3 comentários:

  1. Pensei que você fosse um ocioso. Finalmente você arrumou um cargo: carregador de sujeiras. E para quem não gosta de trabalhar, você conseguiu uma carreira de peso...

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  2. Inumanidade

    “Hoje sinto orgulho que dizer que sou inumano, que não pertenço a homens e governos, que nada tenho a ver com a maquinaria rangente da humanidade – eu pertenço à terra! (…)“Lado a lado com a espécie humana corre outra raça de seres, os inumanos, a raça de artistas que, incitados por desconhecidos impulsos, tomam a massa sem vida da humanidade e, pela febre e pelo fermento com que a impregnam, transformam a massa úmida em pão, e pão em vinho, e o vinho em canção. Do composto morto e da escória inerte criam uma canção que contagia. Vejo esta outra raça de indivíduos esquadrinhando o universo, virando tudo de cabeça pra baixo, e os pés sempre se movendo em sangue e lágrima, as mãos sempre vazias, sempre se estendendo na tentativa de agarrar o além, o deus inatingível: matando tudo ao seu alcance a fim de acalmar o monstro que lhe corrói as entranhas. (…) E tudo quanto fique aquém desse aterrorizador espetáculo, tudo quanto seja menos sobressaltante, menos terrificante, menos louco, menos delirante, menos contagiante, não é arte. Esse resto é falsificação. Esse resto é humano. Pertence a vida e à ausência de vida.“(…) Se sou inumano é porque meu mundo transbordou de suas fronteiras humanas, porque ser humano parece uma coisa pobre, triste, miseravel, limitada pelos sentidos, restringidas pelas moralidades e pelos códigos, definida pelos lugares-comuns e ismos.“(…) Tenhamos um mundo de homens e mulheres com dínamos entre as pernas, um mundo de fúria natural, de paixão, ação, drama, sonhos, loucuras, um mundo que produza êxtase e não peidos secos.“(…) Que os mortos comam os mortos. Dancemos nós os vivos, à beira da cratera, uma última e agonizante dança. Mas que seja uma dança!” -

    (Henry Miller em Trópico de Câncer)

    Lembrei de você, ao ler esse texto.

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  3. Essa sua mensagem está boa para propaganda de produto de limpeza.
    Você não tem o intestino solto OASS.
    Você tem a lingua solta, isso sim!

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