domingo, 31 de julho de 2011

Notas sobre o meu existir N° 14

Era um sábado, primeira aula, latim, dormia, quando fui repentinamente acordado pelo padre vigilante, mais  4 alunos grandões, da turma dos mais velhos. Quando vi a situação ruim, pensei: vai piorar! Foi quando o padre falou:
 - Dormindo! Levante-se e nos acompanhe......
 - Mas, só por que estou dormindo na aula??????
 - Não! Apenas nos siga.
Levantei, é claro, que alternativa tinha diante de 4 grandões e um padre louco por castigar? Saímos da sala e pensei: descobriram meu furto de velas, sabia que não devia ter apanhado 3 maços de uma só vez, porém precisava fazer um estoque para levar na minha pretensa fuga. Mas, para a minha surpresa, ao invés de nos dirigirmos em direção da sala do monsenhor, caminho que tinha que fazer quase toda semana (por motivos banais, por exemplo, ter usado o terço, no claustro, para pendurar o papel higiênico, visto não haver qualquer outra possibilidade de pendurá-lo), fomos em direção ao grande banheiro do seminário. Lá chegando, mais surpresas me aguardavam. 2 pessoas vestidas de aventais emborrachados, segurando a grossa mangueira de lavarmos o chão, alguns escovões, sabão e sei lá que mais instrumentos e substâncias de torturas foram utilizados. Só sei que arrancaram minha roupa, abriram aquela mangueira de água gelada, e esfregaram tudo, arrancando cada uma das minhas infindáveis sujeiras que cuidadosamente acumulava no decorrer dos meus dias pelo meu corpo. Lutei, relutei, gritei:
 - Todo homem tem o direito de viver com sua imundice com toda dignidade!
Mas, abriram a mangueira no máximo, calando-me por completo. Ao fim de uma eternidade, tais torturadores se deram por satisfeitos e me deixaram em paz, jogando uma tolha na minha cara.
Não agradeci.
Naturalmente, quando vi no banco uma batina limpa, uma botina nova, uma bíblia nova e um terço novo, pensei: acho que o próprio bispo é quem deve vir aqui, afinal, por que me limpariam e me arrumariam assim? Após vestir-me, o padre vigilante falou:
 -Siga-me!
Segui, eu mais os 4 trogloditas. Novamente, passamos pelo corredor que ia para a sala do monsenhor e não fomos para lá, surpreendendo-me, e fomos em direção do grande salão, onde normalmente os seminaristas recebem seus visitantes. Da porta vi um vulto feminino ao longe que parecia familiar, e de repente um grito fatídico:
 - MAGRELA!!!!!!!
Era minha mãe e tinha que me chamar pelo apelido que mais detestava. Suportava ser chamado de ratazana de biblioteca, de escudeiro do nada, de inútil, até mesmo de imbecil (o mais usual), mas Magrela, realmente, não tenho palavra suficientemente feia para dizer o que esse termo me causa. Escutei o riso contido dos 4 animais, o padre vigilante tossindo para disfarçar a gargalhada e a respiração ofegante misturada de choro da minha mãe correndo na minha direção, e eu indeciso se vomitava, chorava ou não fazia nada; minha prudência sempre opta por nada fazer. Fiquei estático. Minha mãe me abraçou, beijou, beijou, abraçou e abraçou e beijou e abraçou......... De repente, me empurrou para trás com os mesmos braços que me abraçavam e me olhou com olhos inquiridores. Perguntou:
 -Você está bem? Estão te tratando bem? Como você emagreceu..... E esse cabelo.... e desde quando você deixa a barba crescer, está parecendo cristo...... nossa que batina legal e bem arrumada, você sentiu muito a nossa falta? Olha, tudo que eu e seu pai fizemos é para o seu bem. Mas, afinal, você não fala nada? Como sempre, o velho caladão, eu te adoro Magrela......
E continuou falando, falando, falando..... Soube da vida de todos, nos mínimos detalhes, entre vários beijos e abraços de saudades sinceras. Quando todos se afastaram entediados com a metralhadora bucal de mamãe, foi que ousei interrompê-la, pois ela parecia querer aliviar sua consciência pesada de aqui estar contra a minha vontade.
 - Mãe?
 - Sim, meu filho.
 - Me tira daqui.
 - Não posso. Seu pai quer você longe dos livros errados. Eu também gostaria que você se afastasse deles, e principalmente, parasse de escrever. Você tem um dom especial de escrever coisas que encantam e irritam simultaneamente. E temo que seus escritos te levem para um triste fim, como os autores que mais gosta que, ou foram mortos por suas idéias, ou foram execrados, ou enlouqueceram.  Você deveria usar a sua inteligência e habilidade para algo mais útil. O monsenhor me contou que mesmo aqui você continuou encontrando livros errados e que o transferiu da biblioteca para a lavoura. Creio que isso será bom para a sua formação, você nunca se interessou por essas coisas do campo porque não conhecia. Quem sabe você não descobre uma nova vocação.....
 - Mãe, não quero uma vocação, nem ao menos quero uma profissão. Tudo que quero é ser deixado em paz, ficar conversando com as pessoas, estudando coisas que me interessam, lendo as bobagens que foram escritas e quando possível escrever outras tantas.
 - E vai viver do que? Todo mundo tem que ter uma profissão, seus irmãos já estão encaminhados, até os mais novos já sabem, e você?
 - Bom, acho que vou fazer algumas disciplinas num curso de antropologia, outras de história, algumas de filosofia, um pouco de matemática, depois......
 - E quem vai sustentar tudo isso? Seu pai? Você não conhece seu pai.........
 - Assistirei aulas nas universidades públicas. Não preciso de dinheiro para isso.
 - Mas precisa para tudo mais, comer, vestir, morar, curar suas doenças, enfim, você precisa pensar no futuro. Não acredito que seu pai deixe você sair daqui sem oferecer algo que lhe pareça que você se “curou” do que ele considera seu problema.
 - E qual é o meu problema?
 - Perder a vida lendo e estudando bobagens. Tanto ele como eu consideramos que isso faz de você uma pessoa triste, revoltada, levando a escrever coisas horríveis. Não que você não escreva bem, mas o que diz e a forma como diz, acaba por resultar numa abordagem em que o leitor sempre acabe incomodado de algum modo.
 - E a senhora já leu algum texto meu? Papai queimou os mesmos.......
 - Sempre li seus cadernos enquanto você estava na escola. Você escreve bem, tem pensamentos interessantes, é muito inteligente. Mas, você tem uma amargura que não pertence à sua idade. Você devia estar lendo e escrevendo poesias, ou romances, ou contos, quero dizer, só isso, pois sei que leu quase tudo que temos em casa, mas você fica lendo pessoas entristecida, como é comum acontecer com pessoas que detém muito conhecimento. Eu com 17 anos só pensava em namorar, só queria saber das coisas alegres da vida e detestava coisas sérias. Você não se diverte, não pensa em namorar, raramente o vi dar uma risada, está sempre entretido com assuntos sérios, não vejo alegria nos seus olhos, enfim, você parece uma pessoa entediada com a vida. Por vezes, tenho medo que se mate......
E começou a chorar. Tentei acalmá-la, disse que não era triste, que não sentia tédio nem pensava em suicídio. Disse que gostava da vida, porém de forma diferente dela. E ainda disse que ela não deveria se preocupar comigo ou com o meu futuro, pois era alguém que se satisfazia com pouco e com coisas diferentes da maior parte das pessoas, que tinha felicidade quando encontrava idéias inteligentes, que me divertia estudando a história da humanidade e imaginando as cagadas dos tempos passados, que adorava descobrir novas verdades e perceber minha ignorância.
Ela se acalmou. Olhou bem dentro dos meus olhos e perguntou:
 - Você promete uma coisa?
 - Não faço promessas.
 - Você para de escrever?
 - Não!
 - O monsenhor me disse o que ocorreu com você devido ao seu escrito, na primeira visita que não pode ser feita porque estava preso. Você está aqui por um texto seu. Tanto aqui como em casa, seus escritos acabaram queimados, e você não percebe que são sinais de deus para que pare com isso?
 - Mãe, a senhora não percebe que o problema não está no que escrevo, mas na reação das pessoas a eles? A senhora lia escondida minhas coisas e nunca quis me castigar.......
 - É verdade, mas sempre temia o que aconteceria se a maior parte das pessoas lessem o que escrevia. Foi por isso que sempre quis levar você a um psicólogo, mas você sabe da visão do seu pai sobre a psicologia..... Aquele texto que seu pai queimou sem ler “Deus, Uma Falsa Questão” foi horrível de ler, quando diz que para você é indiferente a existência ou a inexistência de deus, que o lixo te preocupa muito mais, sei lá parece que deus tem menos méritos que o lixo......
 - O lixo, pelo menos, tem o mérito da existência.....
- Magrela, não começa com suas ironias! Mas, afinal, você quer ser um escritor?
 - Já disse que não quero ter profissão. Só quero escrever.
 - Aí, meu deus, não sei o que fazer contigo.......
 - Deixe eu seguir meu caminho.
 - Uma mãe não pode ver seu filho caminhando para o abismo e não fazer nada.
 -  Abismo é onde me encontro agora.
Nos olhamos e ela me beijou forte e abraçou mais forte ainda.
 - Vou falar com seu pai. Realmente, isso aqui para você deve ser uma tortura diária, e acho que você tem mais maturidade que a maior parte das pessoas que conheço, e acho isso desde que você é pequeno. Sempre se relacionou mais com pessoas mais velhas do que com crianças da própria idade, ainda que pouco se relacione com as pessoas, aliás, para variar, pelo que fui informada, você parece não ter amigos, nem participar de nenhuma atividade coletiva aqui no seminário. Você sabe o que quer, ainda que para mim seja um verdadeiro mistério o que fará de sua vida. Mas, acho que você deve procurar seu caminho próprio; você, na verdade, sabe mais o que é certo do que eu ou seu pai.
 - Que ótimo, mãe. Que bom que a senhora concorda comigo.
 - Mas, não posso prometer nada, você sabe como é difícil fazer o general (como chamávamos meu pai quando ele não estava presente) mudar de estratégia. No que depender dele, você fica aqui até os 21 anos, quando se esgota os recursos possíveis para mantê-lo sob sua tutela. Não pense que ele não goste de você. Se você soubesse todos os recursos e uso de influência que ele utilizou e utiliza para que fique incomunicável com o mundo, enfim, o tempo que ele perdeu e perde para tê-lo sob controle é uma prova muito grande de amor, ainda que acredito que você não possa sentir assim. Ele só não veio porque está doente e realizando um tratamento demorado que exige sessões 2 vezes por semana de fisioterapia; está meio travado e não consegue andar direito, com muitas dores pelo corpo, não conseguiria andar de barco para aqui chegar.
 - Mas, mãe, daqui pouco tempo faço 18 anos e ele não poderá mais me obrigar a ficar aqui.
 - Não pense que ele não pensou nisso e ele tem alguma estratégia para essa eventualidade. Só não sei qual.
Foi só calar-me por alguns segundos que ela ligou a metralhadora bucal e me detonou com milhões de perguntas e nem ao menos parava para ouvir a resposta. Contei algumas ocorrências, alguns dos meus momentos horrorosos, algumas das minhas decisões sobre os estudos que estava realizando e querendo realizar. Foram mais alguns bons instantes agradáveis. Porém, todos sabem, o tempo é implacável, passa! E ela teve que ir embora e eu voltar para as duras tarefas campestres. Depois da presença da minha mãe, o melhor da visita foi ter perdido as aulas da manhã e a missa do almoço.
Depois de tenebrosos meses, finalmente, alguma esperança de vida.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

O desânimo no ânimo

Há uma crise existencial profunda, porém pouco percebida, tanto que grande parte parece estar feliz, freqüentar as festividades, divertir-se nos lugares e nas ocasiões, com poucos realmente preocupados com o futuro, mas quase todos esperando algum progresso. Aumentam-se as ofertas de consumíveis e as oportunidades de se entreter, de viajar, de experimentar, mas tudo se torna um acúmulo de gordura mental que embaça mais ainda a visão, que mais cedo ou mais tarde perceberá a tolice de tudo, talvez, quando sufocada pela imundice que produz. O desânimo atingirá o que anima a humanidade há muito tempo, o desenvolvimento econômico, que se mostrará um subdesenvolvimento moral e emocional do homem atual, um processo de domesticação humana que torna a todos mais do que interessados, o que é normal, tornas as pessoas interesseiras. Um novo ânimo para a humanidade se faz necessário, para que ela não seja formada apenas para uma função social e econômica, mas para que seja formada para uma vida pública e citadina do mundo. Qualquer homem deve ser senhor de si e construir o seu lugar entre os homens, e não apenas adequar-se aos lugares sociais pré-estabelecidos pela tradição e pelos costumes. Que a vontade do indivíduo prevaleça em tudo que só diz respeito à própria pessoa!

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Não sou um poeta

Não, não sou um poeta
mas escrevo meus versos
dispersos
diversos
restritos.
Quando assim faço
falo do que sinto
do que cheiro
por vezes do verdadeiro
por vezes minto.
Então, sou um outro
sou ninguém sendo alguém
que faz versos
sem saber ao certo
o que é de fato errado.
Assim, falo de tudo
das flores nos velórios
da roupa dos simplórios
ou do armário antigo que tudo guarda
que são apenas poucas coisas.
Há encanto no mínimo dizer
mas do máximo significar
na forma de usar palavras
para significar um pouco mais
além daquilo que está escrito.

terça-feira, 19 de julho de 2011

O camaleão social

Eis aquele rastejante ser que passa despercebido, em geral, comendo pelas beiradas, disfarçado entre todos na multidão, quando ninguém é visto, sobrevivendo das oportunidades que passam por todos, nunca por eles. Ele não chama a atenção, escondido na paisagem social confusa, é lento e atencioso, olhando sem ser visto, rastejando-se rapidamente até a sua vítima, ou esperando ela chegar desatenta ao seu alcance fatal. Não ocupa grandes espaços como o leão, nem desfruta da virtude de ser astuto como a raposa, o camaleão salienta-se por não ser percebido enquanto se refestela com suas presas. São tão sutis que raramente são percebidos, mesmo por outros camaleões, e a vítima raramente escapa à sua língua grudenta, pois sua arte muda-o de feição e de cor para todos, e de aparente devorador pode se transformar em vítima de devoradores maiores. Sua captura é difícil, pois mais esperam as vítimas do que correm atrás, e mesmo preso, mantê-lo assim é tarefa inglória, visto que se disfarçam e passam despercebidos por todos. Dificilmente se consegue responsabilizá-los pelas ocorrências, pois miméticos, logo se dissolvem na massa daqueles que pouco ou nada sabem. Seus sentimentos são os esperados, suas opiniões desconversas sobre as questões expostas, suas posições serão sempre as majoritárias. Não se destacar é o seu destaque! Não são maus, nem ruins, são fundamentalmente sobreviventes, mas não são confiáveis, mudam até de feitio se precisar fugir de um problema, tendo a tendência de salvar a si, antes do que qualquer coisa.

Para não dizerem que não aprecio oração

Eis uma oração decente: http://www.youtube.com/watch?v=QW0i1U4u0KE

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Raquíticos mentais

A sociedade tem toda uma preocupação de educar o corpo, para que ele não fique flácido ou obeso, prescrevendo uma alimentação saudável para fortalecer o físico. Tenho dúvidas se esse culto do físico é saudável. Mas, quando se trata da mente exercita mais a memória que o raciocínio, tornando-a estreita e sem sustentação para carregar grandes idéias. E não se consegue trabalhar com várias variáveis, não se consegue expandir o horizonte perceptivo, não se consegue estabelecer vínculos intelectivos entre diversos acontecimentos distantes, mas interligados. Há um raquitismo mental que impede a compreensão de ultrapassar a si próprio, se é que se compreende a si mesmo. Todo esforço mental está voltado até a exaustão para a satisfação de todo tipo de desejo. Todavia, a mente não é tão simples quanto pensam, ela precisa de exercício para não ficar flácida ou preguiçosa, para não parar ou se satisfazer na primeira explicação que encontra, para não ficar raquítica e se prostrar perante o menor desafio, rendendo-se ao fracasso da derrota diante de um mero quebra-cabeça. Ela não é formada para desenvolver idéias, mas para aceitar as existentes; não é feita para ousar grandes passos, mas para aceitar os degraus conhecidos. É dela que depende o nosso futuro e não pode continuar jogada para segundo plano, como algo que se atenta quando desatentos de tudo, que parece sempre mais importante ou mais urgente. Exercitar a mente com bons livros, com jogo de xadrez ou mesmo de cartas, com quebra-cabeças, palavras-cruzadas, com boas conversas, com as notícias (que são sempre boas e más) de tudo e de todos, de todos os lugares, enfim, as idéias que os homens fazem sobre si e sobre o mundo e suas trocas simbólicas enriquece a mente com mais coisas que meros interesses, e pode até modificar os interesses, fortalecendo a mente para escapar do raquitismo a que todos estão condenados se não tomarem iniciativa de saírem dessa condição por conta própria. Defendo um contínuo exercício mental para todos, que pode inclusive melhorar a memória, mas que deve ampliar os objetos que se tem que prestar atenção. Se depender da sociedade, todos podem permanecer com suas mentes estreitas, exercendo o único gesto de autonomia que se conhece, o consumo de coisas, que até podem dar um estilo de vida, mas desenvolve pouca compreensão.

sexta-feira, 15 de julho de 2011

As verdadeiras mentiras da verdade mentirosa

Todas as verdades enunciadas desde os primórdios, sejam sobre o homem, sejam sobre o mundo, se mostraram falsas algumas gerações posteriores. As que resistem ainda com fama e estatuto de verdade, longe estão de desfrutarem de uma permanência assegurada e extensa. A rigor nada há de certo ou verdadeiro, senão o que assim instituímos, e depende mais da crença das pessoas na sua assertiva, do que de sua veracidade para permanecer como verdade. De verdadeiro apenas que desfrutamos da consciência de que há mentiras e falsidades nessa vida, e que a verdade talvez seja uma ambição desmedida para a nossa mentalidade e toda verdade mentirosa. O fato é que as mentiras foram sempre mais utilizadas na convivência social e as verdades quase sempre machucam. No mais, apenas mentiras ou falsidades.

Avante navegante

Mais um esforço se quer ser livre. Não se prenda em antigos pensamentos e nem se aprisione em velhos sentimentos, ouse enunciar suas emoções desprendidas de preconceitos arcaicos. A liberdade é uma conquista e um exercício, não se dá e não se recebe, se pratica ao exercer a responsabilidade pelas escolhas e pelo destino de forma consciente, ou menos inconsciente. Só é livre quem não culpa o outro pelos seus fracassos! Só é livre quem não se submete apenas as escolhas sociais e consegue criar escolhas próprias também, inaugurando uma forma de ser e proceder. O fato é que ainda que todos possam deliberar sobre sua vida, poucos experimentam dessa responsabilidade, preferindo cumprir com algum figurino de alguma função social, seguindo mais os costumes do que criando escolhas próprias. Para atingir a liberdade não basta o desejo ou a vontade, é preciso antes de tudo coragem e disposição para caminhar pelo incerto. E aqueles que esperam permissão ou liberação da sociedade ou do Estado para exercerem a liberdade, não estão preparados para ela, pois que desconhecem a liberdade que desfrutam.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

A grandiosidade das pequenas coisas

Contrariamente ao que mostra cinema e romances, são as pequenas coisas que nos encantam, que nos tocam, que nos movem, assim como o próprio cinema e os romances. As pessoas têm amores, amizades, gestos de bondade, profissões, mas nada que vire filme ou romance, apenas pequenas coisas que torna todos ocupados. Um pequeno gesto de caridade diante de alguém necessitado é mais grandioso que um drible de futebol que passa em todos os canais de televisão; um breve dito é infinitamente superior a uma exposição grandiosa de uma idéia ou ao grandioso silêncio em algumas circunstâncias; uma pequena ação para consertar alguma coisa em casa é superior a uma tese para consertar o mundo; uma verdade despretensiosa sobre a ação humana é mais tangível que as grandiosas verdades sobre a existência. Só tolos procuram realizar as grandes coisas sem perceber que a hierarquia do mundo é relativa, variável, realizada de acordo com as circunstâncias e a nossa capacidade de agir ou reagir. São as pequenas coisas do dia a dia que nos ocupam, que realmente importam e contam no cálculo da felicidade, são para elas que estão destinados nossos planos para o futuro. Afinal de contas, nesse mundo poucas coisas são realmente grandes, e quase todas elas são negativas: grandes crueldades, grandes carnificinas, grandes desgraças, grandes medos, grandes superstições, grandes mentiras, grandes ignorâncias. De resto, temos nós a realizarmos nossas pequenas coisas, de preferência em paz. E tudo que é grande, um dia se torna pequeno, por vezes, não mais que algumas gerações depois; o que é constante são as pequenas ações individuais traçando o cotidiano e fazendo uma época, onde alguns se colocam como maiores e a maioria aceita essa designação. Não por ser resignada, mas por ser de todo indiferente as coisas grandes enquanto não atrapalhe sua conquista das pequenas.

Da solidão dos pensadores

Todos que ousam enunciar suas diferenças com relação ao entendimento comum acabam isolados e caracterizados como exóticos. Por vezes são apenas os arautos do que será certo mais à frente, antecipando o entendimento de todos. Obrigado a caminhar sozinho na construção de sua arquitetônica da realidade, solitário enuncia seus argumentos para uma platéia despreparada, como todos são diante da novidade. O que todos pensadores têm em comum é que não se sentem só e carregam a firmeza de suas convicções pela imensidão de dúvidas e descrédito; uma consciência de pertencimento a humanidade brada em todos. Ser um livre pensador tem seu preço, tem que ser ágil e audaz, sendo fruto de uma grande liberação de um espírito maduro que não mais está atado aos valores usuais.
Começa com um súbito horror e suspeita de tudo que venerava, até mesmo do ato de venerar, depois vem um profundo desprezo pelos deveres tão admirados (mesmo que pouco respeitados), então, uma veemente curiosidade o leva a refletir a respeito dos fundamentos da vida usual e sua fragilidade, eis que se tem a erupção da vontade e força de autodeterminação, de determinação própria dos valores e das normas de vida. Não apenas liberado das amarras da tradição, mas desprendido das formas comum de pensar os fenômenos, ousa revelar o que captura com a sua maneira de pensar. Sem dúvida, parecerá despudorado, pois sem os requintes de linguagem, retórica e disfarce dos pensamentos usuais, aparecerá nu como é todo nascimento. Será tido como selvagem e vulgar por anunciar algum tipo de destruição da civilidade aceita, ou por desprezar antigos sentimentos queridos, por revirar os valores, por falsear verdades básicas.
A madura liberdade do espírito, o autodomínio e alguma disciplina permitem andanças por lugares nunca vistos e receitar para si mesmo a saúde necessária para sua sobrevivência. Senhor de si mesmo e de suas próprias virtudes, dos seus prós e dos seus contra e da sua injustiça necessária, como indissociável da busca da justiça, falará do seu ponto de vista e correndo todos os riscos que isso acarreta, do ódio ao desprezo, da raiva à solene indiferença, ou talvez algum remoto reconhecimento. A própria vida está condicionada pela perspectiva da injustiça e da busca do seu contrário.
Naturalmente, o novo falará da distorção de visão do antigo, do necessário deslocamento de perspectiva de vida para captar horizontes menos estúpidos, da perda intelectual que é prosseguir com velhas idéias sobre a existência. Alguém que vê com os próprios olhos não deixará de mostrar alguma originalidade na sua obediência a si, criando suas próprias permissões e interdições que lhe facultam a denominação de homem livre. Como mensuradores da vida e do mundo revelarão novos valores e enunciarão verdades que serão difíceis de serem deglutidas.
Ora, o que mantém os livres pensadores atuantes, não é tanto a certeza de que serão entendidos, mas a necessidade de dizer suas verdades; não falam tão somente para os seus próximos, mas para os futuros. Não é com a aceitação que contam, mas com serem ao menos ouvidos. Solitários guerreiros das idéias próprias a defender outra apreciação dos fenômenos, por vezes, incompreendidos, mal compreendidos, distorcidos, acabam muitas vezes na solidão. Não ocorre propriamente um desajustamento social com a presença de novas idéias, o que causaria o isolamento do seu criador, mas um incômodo intelectual que pode resultar numa desconfiança generalizada das certezas assentadas, o que gera certo ostracismo do pensador. Isso pode resultar numa evolução para certezas mais consistentes, como pode resultar em ruído ou confusão por toda parte.
Assim, do alto da minha solidão, ignorado pela academia e pela comunidade internacional, desprezado pela imprensa e quase inaudível na opinião pública, apresento idéias que causam repugnância, pela sua simplicidade de abordar a vida pelos seus restos, pelo que se evacua, pelo que é desprezado e reduzido a um lugar secundário. Se apontam para as grandes conquistas, aponto para as merdas que permitiram; se falam das grandes virtudes, falo dos vícios necessários; se discutem o justo, discuto o injusto; se querem as grandes verdades, apresento apenas as pequenas e despretensiosas verdades do agir humano. Enfim, acho necessário que se aponte a bosta diária das atividades displicentes da humanidade, mais do que enaltecer um suposto e duvidoso progresso humano. Sou mais um cavaleiro solitário a falar contra o desenvolvimento econômico, o progresso, os baixos valores sociais, a futilidade das pessoas e seus disfarces, os sentimentos superficiais e as emoções exageradas que promove, a ignorância cultural, e que a maior produção humana é de lixo.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Da série pensamentos evacuados

Não lamentem tanto as merdas recebidas, mas sim as realizadas, pois ainda que as primeiras te tornem mártires, principalmente aos próprios olhos, será as segundas que lhe darão fama nos olhos dos demais, e pelo que serão lembrados.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Notas sobre uma filosofia intestina – um comerciante honesto, mas sem virtudes cívicas

Não há força civilizatória maior que o comércio, criando intercâmbios culturais e com ele a tolerância, para trocar não apenas mercadorias, mas também interesses, cultura, juntando necessidades distantes ou mesmo criando-as através de ofertas diversificadas. As trocas humanas no decorrer dos séculos nos uniram de alguma forma, apesar das guerras religiosas, territoriais ou expansionistas. Há uma comunidade internacional que vive de trocar coisas, que comunga de muitos princípios comuns, que circula por toda parte do planeta.
Até aqui estaria tudo perfeito, não fosse o comércio hoje ser fundamentalmente um problema financeiro, onde o produto adquirido é o resultado financeiro do produtor e do comerciante, ou mesmo do adquirente, caso financie o produto também. O mundo está financiado. E para um mundo que cresce sustentado em dívidas, só interessa o desenvolvimento econômico, pois conta com o crescimento para pagar as dívidas dos empréstimos, nem que para tanto tenha que alterar dinâmicas sociais e políticas para que possa se expandir indefinidamente, obrigando a todos viverem em função dessa variável da vida, que a rigor não é a mais importante.
O desenvolvimento econômico tem provocado um rebaixamento moral da sociedade, desde que assumiu o papel de variável maior a projetar o destino comum. Tudo perdeu o valor e a dignidade e adquiriu um preço e alguma utilidade temporária. O tipo ideal de homem é aquele que está mais preocupado com o seu bem estar, com a troca de um eletrodoméstico, do que aquele que defende a abnegação republicana ou desenvolva sentimentos humanitários. O enriquecimento monetário não deixa de ser um empobrecimento das virtudes cívicas, porque cada vez mais se pensa em pagar para não participar da vida pública e comum; se aposta num Estado provedor, ainda que endividado. Antes de cidadão, todos se entendem e se satisfazem em serem contribuintes. É de se notar, que o crescimento da futilidade promove o desenvolvimento econômico, pois quanto mais fúteis são as pessoas, mais consomem coisas desnecessárias, mais se endividam para ter.
Como diria o bom Rousseau, o amor por si foi liquidado pelo amor próprio criado pelo desenvolvimento econômico e social. E é esse amor próprio que busca mais brilhar do que ter valor, mais vencer do que conviver, mais ostentar do que ser, e promove o desenvolvimento econômico com as pessoas buscando os enfeites para disfarçar suas supostas imperfeições, ou parecer importante pelas coisas que possui. Assim se perde a compaixão pelo próximo, o interesse pelas coisas comuns, e se prende num universo privado, buscando a satisfação nos bens que conquista ou se lamentando pelas dívidas contraídas. A ciência, as especializações, as aparentemente grandiosas conquistas da humanidade, mais do que nos libertar do trabalho ou mesmo da ignorância, promovem mais locais onde se gasta mais horas de trabalho, ou promovem novos mitos e superstições.
E tudo nesse mundo vira um negócio: a doença, a desgraça, a dor, o roubo, a morte, tudo tem o seu preço. Mesmo o bandido tem o seu valor. O que seria da polícia se eles não existissem? Não tem juiz que não agradeça o fato de haver pessoas desonestas, obrigando a todos honestos ficarem brigando pela verdade e justiça nos tribunais. A indústria da vigilância agradece todo dia o fato de haver ladrões e desonestos no mundo. A desgraça de uns, são os lucros dos outros, que o diga a funerária e o coveiro. Nesse mundo não se pode ser todos felizes, pois a felicidade de alguns depende da desgraça de outros, tudo gera renda, até mesmo a infelicidade, assim, ainda que haja descontentes, nunca estão todos descontentes. E a rigor não há imoralidade alguma nas pessoas abrirem seus negócios e lucrarem com a desgraça humana, pois alguém tem que fazer o trabalho sujo de limpar a sujeira. Mesmo os vícios podem gerar renda e impostos para benefícios públicos. A moralidade, aliás, nesse mundo, é uma questão não apenas secundária, mas amplamente dispensável diante de qualquer oportunidade de negócio. E se não reina a imoralidade, a amoralidade impera na prática diária, e a deliberação individual depende de um critério de utilidade determinado por uma consciência de um egoísta supostamente esclarecido sobre o que é lícito ou não fazer.
De fato, poucas coisas restaram com valor. O próprio termo “valor” está esgarçado, e no geral se confunde com o preço. Parece que tudo que é tangível, é pagável. A dignidade, a coragem, a virtude perderam o significado, e no seu local surgiram a fama (temporária), o pragmatismo (hedonista), a realização (egoísta). A lealdade foi trocada pelas constantes trocas de desejos e produtos, de causas, de princípios, ou até mesmo de pessoas. Vence-se e atinge os holofotes das celebridades pelo esporte, pela arte, pela política, pela fortuna, pela beleza, tudo financiado e comercializado, nunca pela participação cívica ou pela posição política ou humanitária. A participação cívica é vista como coisa para santos abnegados, que tem algum valor, mas não vale tanto como um jogador de futebol ou um cantor. A coragem de sair nas ruas e bradar por causas justas é importante, também tem algum valor, mas só para aqueles que têm tempo, afinal, pensa a maioria, já é um contribuinte que colabora para o bem comum e prefere usar o tempo para passear na praia, visto que o valor pelo civismo não passa de uma passageira admiração. E assim ninguém, ao fim, quer participar da vida pública, deixar sua privacidade ou vida doméstica e ir à praça defender seus interesses ou lutar para que interesses nefastos não prevaleçam no interesse público. A maioria está preocupada em como adquirir bens, como pagar menos impostos, como pagar as dívidas, como ascender na vida social.
O rumo do mundo e da vida em comum são questões para os telejornais e suas reportagens, ou para os livros de ficção. Desde que esteja ocorrendo algum desenvolvimento econômico e as crises econômicas continuando como apenas alguma turbulência momentânea na empregabilidade das pessoas, poucas coisas preocupam o cidadão comum. A preocupação de todos é obter algum desenvolvimento econômico para satisfazer caprichos e futilidades. Não falta tanto o necessário para as pessoas, mas o supérfluo, algo que não apenas satisfaça uma necessidade artificial, mas que realize também algum tipo de distinção perante alguma comunidade: a felicidade e a satisfação não bastam, é preciso que invejem a felicidade e a satisfação obtidas. E ainda que se fale muito do nosso interior, o que distingue as pessoas aos olhos comuns são as coisas, objetos valiosos que possui ou cargos e posição social que ostenta.
Desse modo, com a vida governada pelas oscilações econômicas, gerando oscilações sociais e políticas, e a amoralidade generalizando-se pela ação comum, todos procuram tirar vantagem mesmo da desvantagem, visando o lucro ou a compra de algum bem, principalmente os supérfluos, tendo o dia a dia regido pelos ganhos ou custos financeiros. Cada pequena coisa comprada vem embalada e gera lixo, acrescenta necessidade na vida e, na maior parte das vezes, ao fim, se descarta, nem sempre de forma apropriada. O enriquecimento econômico da sociedade tem gerado milhões de consumidores contumazes, muitos endividados, ao invés de permitir menos horas de trabalho, com pessoas dedicadas ao auto-cultivo e ao cultivo das causas públicas, ou mais recursos e dedicação para as questões humanitárias.
E se é forte afirmar que o desenvolvimento econômico se dá por uma imoralidade social, o fato é que impera alguma amoralidade na forma de se perceber um mundo repleto de valores, que passam despercebidos na busca cega dos interesses próprios. Do ponto de vista cívico, contentam-se em não serem ilícitos e de serem contribuintes, por vezes, eleitores. Do ponto de vista humano, contentam-se em não maltratar o próximo e por vezes fazer caridade. No mais, sonham com coisas que ainda não têm. E quando avistam o mundo, vê o preço das coisas, os custos das viagens, as roupas que precisam, as dificuldades de ascenderem ou de manterem o status. O mundo é algo que se cobiça e se reclama, e as pessoas ou são úteis ou atrapalham, e contam-se os centavos para comprar mais alguma coisa. As pessoas caídas nas sarjetas, as desesperadas pelos cantos, as aparentemente inúteis que trafegam pelas ruas, tudo é algo que se paga ao Estado para limpar das vistas e da consciência.
Os homens hoje são comerciantes honestos e cumpridores razoáveis da lei, mas nem se dispõem a melhorar a lei, ou a si mesmos para serem mais sensíveis as dores humanas, nem pensam que podem modificar o mundo. Lutam pelos seus interesses dentro das regras do jogo, mas nem pensam em mudar as regras ou mesmo acabar com o jogo, pois que não somos obrigados a viver de acordo com a economia e a sua “lógica” e a sua “ética”. O problema do desenvolvimento econômico não deveria ser o fator determinante da conduta pública, nem a aquisição de bens o objetivo principal de vida, mas antes a satisfação das necessidades primárias de sobrevivência, e o resto do tempo dedicado para a contemplação e devida apreciação da convivência humana e sua potencialidade mútua. Defendo que se deixe a condição única de comerciante para a qual a sociedade forma as pessoas, dando-lhes profissões para comercializar seu ofício, e que se centre na formação de um cidadão do mundo, que dê tanto valor às trocas espirituais como se dá às trocas materiais, e que saiba apreciar a pluralidade humana.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Bosta à vista!

Os Estados não pagam suas dívidas há muito tempo, rolam os títulos da dívida, substituindo os antigos por novos. Os mais “confiáveis” pagando pouco ou mesmo nenhum juro, os menos pagando caro o juro aos emprestadores, via de regra, instituições financeiras. O descontrole na emissão desses títulos é tanta, que hoje nenhum Estado tem condições de resgatar seus papagaios, e se todos que possuem títulos da dívida forem ao balcão do Estado, só receberão novos títulos, jamais dinheiro. A Europa já está revelando a fragilidade do sistema, Estados que devem muitas vezes mais do que aquilo que possuem para pagar. O grande presidente dos Estados Unidos pedindo ao seu congresso que amplie a capacidade, não de pagamento, mas de endividamento do Estado, é outra fedentina bem saliente para qualquer narina afiada perceber a merda que dará tudo isso. Enfim, aqueles que têm dinheiro devem ficar atentos, pois tudo que está parecendo bastante sólido, pode de repente despencar ou dissolver, talvez, levando consigo até antigas instituições, por exemplo, moedas. Ouro é sempre uma alternativa, porém facilmente roubável. Entretanto, antes se preocupe com a multidão de desocupados fazendo um rapa nas coisas da casa de todos. Hordas de pessoas vagando sem rumo num mundo falido. Daí, talvez, entenderão porque, desde já, não trabalho e aprendi a sobreviver de restos: anuncio essa catástrofe há mais de uma década.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

O coração é uma bomba

Dizem que trago sempre más notícias, principalmente quando descarno a realidade dos seus mitos, mostrando a simplicidade de tudo. O coração, por exemplo, o que é, senão um instrumento orgânico a bombear sangue pelo corpo? Não traz os encantos que os poetas e os videntes exageram, nem carrega os sentimentos mais íntimos, ainda que possa bater mais forte ou mais lento conforme as emoções. É mais um pedaço de carne do nosso corpo a se submeter às nossas suscetibilidades. Onde se faz o que sentimos, pensamos, o que nos faz agir, onde se obra nosso ser, nossa essência mais íntima é na mente que impulsiona a vontade, a imaginação e a ação na concretização do que se é. Coração é coisa de cardiologista, que, se espera, saberá desobstruir os canais entupidos pelos péssimos hábitos alimentares.
Quanto à mente, dizem que se localiza no cérebro, produzida pela matéria encefálica, pelos neurônios. Tenho minhas dúvidas e faço minhas apostas nos intestinos, mais apropriados para justificar boa parte do resultado da ação humana. O homem tende a procurar no alto, quando a maior parte das explicações está nas partes baixas. Quer o grande, mas foi feito para o pequeno. E o que tem de mais profundo são os intestinos.

Questões difíceis

Amigos falam que mesmo tendo alguma inspiração para escrever, não tenho para divulgar os escritos, e que, portanto, sou um total desperdício. De um lado, nada faço de útil e bom para a sociedade, ainda que também não dê trabalho ou despesa; por outro lado, faço alguns escritos, mas os mesmos não transcendem poucos leitores, que na maioria já compartilham da minha convivência, e não suportam ter de ler o que vira e meche digo pelos quatro ventos. Enfim, por que escrevo se não há leitores? Perguntam-me e respondo, mesmo que não me levem a sério. Digo que escrevo como uma missão que me foi imposta pela consciência, anotando toda merda que vejo, as porcarias que aprendo com os outros, autores ou não, para deixar grafada minha indignação com a vida medíocre da humanidade. Afirmo para todos que conto que os escritos serão captados e transmitidos, com o tempo, através das pessoas que se sentirem tocadas. Por fim, alego também que não tendo muito que fazer, posso escrever a vontade. Um dia, quem sabe, não poderão ser esses escritos inúteis que me farão alguma coisa de útil para a sociedade...... De minha parte, garanto, enquanto tiver alento e alguma fedentina me incomodando, escreverei! Felizmente hoje não escrevo mais em papel e meus textos não precisam ser mais queimados; basta serem deletados.

Nota de falecimento

Lamento informar a morte da Verdade, se é que a humanidade a obteve em alguma época. Verdade que em seu nome muitas mentiras foram enunciadas, muitas falsidades foram criadas e muitas mortes anunciadas e executadas, mas, apesar disso, durante suas existências (pois foram muitas as verdades no decorrer dos séculos) muitos conseguiram alguma certeza, ainda que equivocada. O fato é que se algum dia o homem teve uma Verdade, hoje cada um tem a sua. Particularmente, acho que o mundo ficou menos falso e bem menos mentiroso com o fim da Verdade. E cada um com suas pequenas verdades, luta para não se submeter a qualquer outra Verdade morta.

terça-feira, 5 de julho de 2011

A morte e a vida

Confesso que a morte nunca foi para mim uma desgraça, nem mesmo um mal, mesmo ocorrendo com pessoas queridas e ficando triste. Sempre achei a vida algo bem pior e a morte tão somente parte da vida. A dor sim me preocupa, o sofrimento é que toma minha atenção, e tudo isso para evitá-los tanto quanto possível, o que é inevitável ocorrer algumas vezes, seja sofrendo-os, seja praticando-os. Mas, o que considero realmente um mal e extremamente preocupante é a ignorância dos homens, que ainda buscam a punição antes da compreensão nas atitudes dos diferenciados. Isso já causou muitas mortes no decorrer da história. E mais preocupante que morrer, é matar! Mas, matar tem sido parte integrante desta vida medíocre, ainda que morrer seja de qualquer vida.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Piadas e a sua graça

Os maiores piadistas que conheci, eram também as pessoas mais tristes: faziam graça de suas desgraças. E como as desgraças eram grandes, grandes eram também as piadas. Eu que tenho uma vida amena, nem desgraças nem fortunas me sorriem, nem alegre nem triste posso ser, e minhas piadas se ri de forma amarga e quase sem graça. O sorriso que provoco incomoda, porque de alguma forma toca a todos pessoalmente. É que falo de bosta e todos fazem as suas. Já a vida é uma grande piada, se bem que na maior parte do tempo não tenha graça.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Manifestações públicas de afeto

Vejo pessoas se beijando pelo computador, expondo publicamente em redes sociais algo que é do reino do íntimo. Mas, há coisas que não se deve fazer na multidão, onde muitos interpretam mal mesmo inocentes gestos. O mais amoroso é ser atento, antes de distribuir beijos que podem inclusive prejudicar os beijados, quando não o próprio beijador. O fato é que não há informação que não se possa usar contra nós, e cuidar de si, assim como do outro, creio que faz parte das regras de civilidade contemporânea, cheia de processos e tribunais para todos os lados.

Da série pensamentos evacuados

Entre morrer e estar morto, todos preferem o primeiro, na vã esperança de que não atingirão o segundo.

Depreciação geral e irrestrita

Uma das coisas que mais aprecio é depreciar a vida, não porque ela nada vale, mas porque não vale tanto como induzem a pensar. A vida é um ônus que temos que carregar, se possível, com um mínimo de dignidade, ou seja, sem se ajoelhar aos ídolos sociais, nem para ninguém. E nos arrastamos pela existência buscando satisfação, alguma felicidade e bastante afeto, e nem sempre se consegue, eis o que é certo, pois mesmo que no momento desfrutamos de tudo, nada impede que venhamos a perder: a fatalidade é muito democrática e a qualquer um pode atingir. Além disso, não se deve esquecer, há sempre aquelas merdas que pisamos em nossa caminhada diária pela sobrevivência. Mas, nem por isso acho a vida ruim ou má, acho apenas muito trabalhosa, principalmente quando temos que limpar os fétidos resíduos de bosta do calçado.

Fofocas

Falam de mim por aí sem conhecimento de causa. Muitos querem se mostrar próximos ou íntimos, quando raros são os que desfrutam de minha intimidade. Pior é ficar ouvindo a fofocagem e pouco ou mesmo nada poder fazer. Verdade que não me dou ao trabalho de checar os ditos, e honestamente nem gostaria de saber que eles existem. O que me entristece é ver minha imagem enxovalhada, pois ainda que seja um bosta, não sou a merda que falam.