segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Ruminação n° 3

Eis que aqui estou. No privado, dentro de mim? Com certeza..... mas, eu que aqui estou privadamente, não sei onde estou em mim, no meu corpo, e ainda assim vejo tantas coisas dentro de mim. Esse privado tem um pouco de intimidade, de coisas particulares, de percepções, sensações, pensamentos, emoções, razões, imaginações, relações, problemas e tantas outras coisas para as quais não encontro palavras. Talvez, o mais privado de (e para) mim: eu mesmo. Todavia, isso nunca me preocupou e não será agora que irá começar. Se está na alma, no corpo, em ambos, em nenhum, pouco importa, o que importa é que esteja em mim, esse ser que escreve essas palavras (que agora escrevo e que agora lê, feitos em momentos diferentes, mas que ocorrem agora também). Tenha ou não tenha alma, mente, razão, consciência, esteja certo ou errado, sou eu que digo essas coisas, erradas ou certas....., ou não?
Por que as palavras? E por que escrever? Para falarmos do mundo e de nós, entre nós, para nós, e até com nós mesmos. Que esse privado me pertence seja verdade, só conheço-o porquê uma série de palavras que me ensinaram ou aprendi por conta própria (permitido a mim mesmo com um pouco de auto-determinação metafísica nos momentos de ócio) me apontaram sua significação, que só se completa com o aval público, que lhe aponta o lugar entre os homens. E boa parte das palavras aponta para coisas que não podem ser indicadas com o dedo ou ser mensuradas, como amizade, amor, afeto, certeza, dúvida, pois ainda que possa sentir ou pensar individualmente, eles dependem para existir do outro (seja esse outro um, vários ou mesmo todos), que me diz o que não percebo por mim mesmo. Vingo-me fazendo o mesmo a todos. O que não pode ser negado é que a significação privada, para poder existir plenamente, precisa do público, sem o qual, aliás, não seríamos nada, nem ao menos privados, pois sem a platéia a nos assistir, nada somos ou representamos. Seja lá o que seja, sou o que faço entre os homens, pelo que merecerei ser lembrado ou devidamente esquecido.
Quanto às palavras, penso que, não a razão (essa coisa comprometida com a certeza), mas a razoabilidade nos indica que se conhece muitas, usa-se poucas, que muitas são confusas, outras não indicam nada, que muitas são ambíguas, assim é aconselhável apropriar-se delas com muito comedimento. Aristóteles diria para não pegar os termos muitos grandes (extensos em significação), nem os muitos restritos (pequenos de conteúdo), mas o meio termo. Mas, nunca fui aristotélico, acredito no exagero e no excesso como virtudes, por exemplo, contra os atos injustos.
Por outro lado, nunca substituo algo que não sei, por algo que sei menos ainda. Se não sei onde estou, não pressuponho saber. Haja mente ou não, interno e externo, consciência, entendimento, autonomia, liberdade todos esses termos e muitos mais, me aproprio apenas quando quero significar algo para os demais, quando quero indicar algo que me parece significativo ou relevante para ser levado em conta, e, talvez, só naquele momento.
Assim, arriscando que exista liberdade, a possibilidade de agir por algum tipo de vontade própria, que permite a ação que escapa ao comportamento usual, ouso tecer alguns comentários pessoais (que podem ser privados, particulares, próprios e até mesmo impróprios (o que, no caso, escapa ao controle do emissor), ou nenhum deles), que se espera privado, mas que são públicos, mesmo que o público seja de uma pessoa só, e são também virtuais, seja pela virtualidade do veículo de comunicação, seja pela virtualidade dos sentidos que se pode ter ou induzir.
Naturalmente, se fosse para fazer um chute de onde está o “eu”, se na alma, no espírito, na mente, no cérebro, é público e notório que optaria pelo intestino; somos muito mais intestinais que supõe a vã filosofia, apenas a nossa auto-estima elevada não permite perceber, que mais que idéias, temos gases, e que endiabrados pelos odores fétidos deles, incautos acabam realizando enormes cagadas. Todavia, a rigor tudo no corpo é necessário para sermos o que somos, no corpo que conquistamos com os nossos esforços ou relaxos, dentro dos limites que a natureza estabeleceu e estabelece: sexo, idade e herança genética de saúde ou patologias. E seria tolo brigar por um lugar privilegiado onde isso ocorra em nós (e não apenas dentro, ou no corpo, não apenas em substâncias biológicas, mas também de forma eminentemente simbólica!), visto que qualquer um que tenha qualquer parte ameaçada do seu corpo, sente como uma ameaça a si mesmo.
Por fim, mas não por último em importância, tenhamos ou não alma, mente, razão, consciência, intestino ou qualquer outra designação que se queira dar como responsável pelo nosso egoísta (para não dizer mesquinho) “eu”, são palavras que designam a nossa realidade simbólica, e sua evidência é totalmente terminológica. Assim, não estranho as designações dos inexistentes no meio de tantas coisas supostamente existentes, pois os termos existindo, são inevitáveis as relações que fazem com eles. O problema quando se tem muitos termos para designar algumas atividades humanas, é que, de fato, não se tem nada de muito explicativo para demonstrar com eles. Metáforas não nos faltam para falar do homem, nem para distingui-lo dos demais animais, entretanto, quase todas, mais do que distinção, apresentam qualificações dos homens ou desqualificações dos animais.
Quanto às ciências sociais e biológicas, até o momento, carecem de isenção, carregadas que estão por uma terminologia moral, estando assim incapacitadas para tecerem opiniões que possam ser aceitas pela comunidade dos homens. Moralizam os pequenos gestos, descrevendo-os em forma de patologias e vícios, vendo purezas e impurezas por toda parte. A busca de uma normalidade inexistente cria uma anormalidade social, de alguns acharem que sabem o que é normal ou não para todos, e em todas as circunstâncias, além da anormalidade de algumas especializações de se alçarem as únicas a diagnosticarem as patologias individuais ou coletivas, e o que é pior, a sua cura!

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