quarta-feira, 13 de julho de 2011

Da solidão dos pensadores

Todos que ousam enunciar suas diferenças com relação ao entendimento comum acabam isolados e caracterizados como exóticos. Por vezes são apenas os arautos do que será certo mais à frente, antecipando o entendimento de todos. Obrigado a caminhar sozinho na construção de sua arquitetônica da realidade, solitário enuncia seus argumentos para uma platéia despreparada, como todos são diante da novidade. O que todos pensadores têm em comum é que não se sentem só e carregam a firmeza de suas convicções pela imensidão de dúvidas e descrédito; uma consciência de pertencimento a humanidade brada em todos. Ser um livre pensador tem seu preço, tem que ser ágil e audaz, sendo fruto de uma grande liberação de um espírito maduro que não mais está atado aos valores usuais.
Começa com um súbito horror e suspeita de tudo que venerava, até mesmo do ato de venerar, depois vem um profundo desprezo pelos deveres tão admirados (mesmo que pouco respeitados), então, uma veemente curiosidade o leva a refletir a respeito dos fundamentos da vida usual e sua fragilidade, eis que se tem a erupção da vontade e força de autodeterminação, de determinação própria dos valores e das normas de vida. Não apenas liberado das amarras da tradição, mas desprendido das formas comum de pensar os fenômenos, ousa revelar o que captura com a sua maneira de pensar. Sem dúvida, parecerá despudorado, pois sem os requintes de linguagem, retórica e disfarce dos pensamentos usuais, aparecerá nu como é todo nascimento. Será tido como selvagem e vulgar por anunciar algum tipo de destruição da civilidade aceita, ou por desprezar antigos sentimentos queridos, por revirar os valores, por falsear verdades básicas.
A madura liberdade do espírito, o autodomínio e alguma disciplina permitem andanças por lugares nunca vistos e receitar para si mesmo a saúde necessária para sua sobrevivência. Senhor de si mesmo e de suas próprias virtudes, dos seus prós e dos seus contra e da sua injustiça necessária, como indissociável da busca da justiça, falará do seu ponto de vista e correndo todos os riscos que isso acarreta, do ódio ao desprezo, da raiva à solene indiferença, ou talvez algum remoto reconhecimento. A própria vida está condicionada pela perspectiva da injustiça e da busca do seu contrário.
Naturalmente, o novo falará da distorção de visão do antigo, do necessário deslocamento de perspectiva de vida para captar horizontes menos estúpidos, da perda intelectual que é prosseguir com velhas idéias sobre a existência. Alguém que vê com os próprios olhos não deixará de mostrar alguma originalidade na sua obediência a si, criando suas próprias permissões e interdições que lhe facultam a denominação de homem livre. Como mensuradores da vida e do mundo revelarão novos valores e enunciarão verdades que serão difíceis de serem deglutidas.
Ora, o que mantém os livres pensadores atuantes, não é tanto a certeza de que serão entendidos, mas a necessidade de dizer suas verdades; não falam tão somente para os seus próximos, mas para os futuros. Não é com a aceitação que contam, mas com serem ao menos ouvidos. Solitários guerreiros das idéias próprias a defender outra apreciação dos fenômenos, por vezes, incompreendidos, mal compreendidos, distorcidos, acabam muitas vezes na solidão. Não ocorre propriamente um desajustamento social com a presença de novas idéias, o que causaria o isolamento do seu criador, mas um incômodo intelectual que pode resultar numa desconfiança generalizada das certezas assentadas, o que gera certo ostracismo do pensador. Isso pode resultar numa evolução para certezas mais consistentes, como pode resultar em ruído ou confusão por toda parte.
Assim, do alto da minha solidão, ignorado pela academia e pela comunidade internacional, desprezado pela imprensa e quase inaudível na opinião pública, apresento idéias que causam repugnância, pela sua simplicidade de abordar a vida pelos seus restos, pelo que se evacua, pelo que é desprezado e reduzido a um lugar secundário. Se apontam para as grandes conquistas, aponto para as merdas que permitiram; se falam das grandes virtudes, falo dos vícios necessários; se discutem o justo, discuto o injusto; se querem as grandes verdades, apresento apenas as pequenas e despretensiosas verdades do agir humano. Enfim, acho necessário que se aponte a bosta diária das atividades displicentes da humanidade, mais do que enaltecer um suposto e duvidoso progresso humano. Sou mais um cavaleiro solitário a falar contra o desenvolvimento econômico, o progresso, os baixos valores sociais, a futilidade das pessoas e seus disfarces, os sentimentos superficiais e as emoções exageradas que promove, a ignorância cultural, e que a maior produção humana é de lixo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário