quarta-feira, 14 de março de 2012

Das férias à crua realidade

Tantos me perguntaram onde estive, por que de minha ausência durante longo tempo. Ora, tirei férias. E me perguntarão: férias? Por que um desocupado, que não trabalha, precisa de férias, e o que é pior, não tendo recursos financeiros, como a desfruta? Todos têm direito às férias, é um direito pétreo, como a preguiça. Creio que me incluo entre todos, ainda que seja bem particular. Não que precise descansar ou mesmo aliviar a tensão da labuta diária, visto que pouco faço, mas mesmo ficar sem fazer nada por vezes é exaustivo e o respiro de novos ares, se não fazem bem ao pulmão, distraem a mente, e é isso que é importante. Afastar-se dos livros, do computador, dos afazeres domésticos é algo necessário para perceber que mesmo as coisas supostamente fundamentais podem ser descartadas, e vive-se bem fazendo menos coisas ainda que se faz cotidianamente.
Convidado por um casal amigo, comecei as férias acompanhando eles e seus filhos nas suas férias de verão, em sua casa de praia. De pouco valeu alertar, antes da partida, que praia, como desejavam, com sol, no verão, só existe em propaganda de cerveja. O normal é chover, por vezes, por dias seguidos, como de fato ocorreu. Aliás, graças a essa observação, lembraram de pegar o baralho e outros jogos, que foi importante para matar o tempo. Acordavam toda manhã e avistavam o nublado do tempo, depois a garoa e a chuva forte, e quando não estavam jogando, sentavam no sofá para assistir a TV, onde viam as enchentes a derrubar casas e arrasar rodovias país afora, e, de certa forma, os deixavam mais conformados; se não estavam pegando sol, não estavam sendo carregados pelas chuvas. Para mim o clima estava ótimo. Saia a caminhar na garoa pela praia, onde outros poucos estavam a caminhar ou correr, tinha até gente jogando bola, alguns corajosos brincavam no mar.
Dez dias ininterruptos de chuva e voltaram para sua morada na cidade. Mal pus os pés em casa, afamado que sou por pouco ter o que fazer e estar sempre disponível para novas aventuras, fui procurado por uma amiga para acompanhá-la nas terras dos seus pais, que estavam isoladas devido as enchentes que ocorriam na região. Sabe que além de bom nadador, sou um bom remador. Foi certamente uma aventura antropológica interessante, ver o desespero estampado no rosto dos atingidos, que nada tinham e perderam tudo. Arrumamos um pequeno bote a preço de ouro e fomos remando até a casa dos seus pais, isolados no seu sítio. Depois de algum esforço, lá chegamos, mas seus pais não queriam sair de sua casa, na verdade, nem queriam ser salvos, nem se achavam ameaçados, visto que a casa ficava longe do rio; só queriam suprimentos, pois a ponte que ligava a área rural à cidade havia sido levada pela enxurrada. Enfim, após muito bate boca entre minha amiga e seus pais, acabamos tendo que remar de volta, ir à cidade comprar suprimentos e voltar novamente para entregá-los. Sem dúvida, foi um verão bem esportivo, esportes náuticos, graças a boa natureza que sempre castiga algumas áreas com sua fúria, visto que durante as 2 semanas que lá estive, não foram poucas as vezes que tive de atravessar o rio para ir até a cidade atrás de alimentos. Só ao fim da estadia consertaram a ponte.
Na região, muitos falavam mal das autoridades que não percebiam que todo verão ocorriam sempre as mesmas tragédias, por não terem tomado as providências antecipadas, quando eles mesmos incorriam no mesmo erro, sempre construindo casas em locais onde alaga todos os anos. Na verdade, ninguém quer ver sua parte na tragédia pessoal e nacional, e buscam culpados para infelicidades que todos são responsáveis. A verdade é que ninguém se importa como os demais moram, e as pessoas escolhem suas moradas ainda que saibam dos riscos de lá morarem. Para onde olho, vejo pessoas morando em área de risco, e nem quem lá mora, nem quem por lá passa, nem as autoridades sabem o que fazer. A tragédia só não é maior porque muitos têm sorte, se é que podemos usar esse termo para quem perdeu tudo, quando não seus entes queridos, e mora agora numa sala de aula de uma escola que é usada como abrigo.
Todavia, como fiquei ausente, meu sumiço gerou a curiosidade de bandidos que foram roubar minha casa. Após arrebentarem a porta do fundo inutilmente, uma vez que a porta de frente está com a fechadura quebrada há anos, e só fecho a porta sem trancá-la, constataram que nada havia para ser roubado. Reviraram minhas poucas coisas a procura de algo de valor, sem verem o valor das coisas, e nada encontraram para levarem. Por fim deixaram um bilhete malcriado, dizendo que nunca tinham entrado numa casa onde não tivesse ao menos um par de sapatos para levarem, ou alguma bebida, ou mesmo um pacote de bolacha. Na minha só tinha lixo e coisa usada. Muito ofensiva esta observação, afinal de contas, se uma faca velha é lixo para quem tem muitas novas, para quem não tem nenhuma, é um luxo. E ainda xingaram minha pobre mãe por ter posto um bosta no mundo que não serve nem para ser roubado.

2 comentários:

  1. Ô férias agitadinha né OASS?
    Vc de acompanhante foi "ótemo".
    Agora o bilhete dos bandidos xingando sua mãe por ter tido você foi uma injustiça.
    Vc devia se possível, dizer que muito pelo contrário, vc agradece muito à sua mãe...rsrsrsrsrsrsrs

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