sábado, 30 de abril de 2011

Uma estranha característica

Possuo uma característica que vem se acentuando desde a adolescência: ou me amam, ou me odeiam. E quem me ama hoje, por vezes, amanhã, me odiará, e quem antes me odiava, de repente, pode começar a me amar. Não promovo sentimentos amenos nos demais, nem mesmo a indiferença, quando conhecido. Contudo, como tudo, posso ser esquecido ou abandonado, ou, mais contemporâneo, deletado, via de regra, como uma reação intempestiva a algo dito ou não dito por mim. Sendo eu mesmo incapaz de amar ou de odiar, como poderia corresponder seja ao amor seja ao ódio alheio? E de pouco vale afirmar que cultivo os afetos amenos como a amizade, alguns esperam algo que sou incapaz de dar: o monopólio de minhas atenções.

Meu otimismo

Não poucas vezes fui acusado, erroneamente, que carrego algum tipo de pessimismo, já me chamaram até de amargo, estigma que carrego só porque descrevo a realidade. É verdade que tendo a achar que a vida está piorando, ainda que mais pessoas se tornem consumistas e o padrão de vida econômica mundial esteja melhorando, pois o fato relevante nessa história é que as praças de alimentação dos Shoppings estão cada vez mais ocupadas, e você terá que ficar esperando, com a comida esfriando, por um lugar. Compra-se mais embalagens, compra-se mais porcarias que não se usa, só para ter, todos empacotados e produzindo lixo.
Pessimista seria se achasse que deveria ser diferente, ou se fosse viver tempo suficiente para assistir o caos de lixo e merda flutuando pelos oceanos. Felizmente meu fim será bem mais breve e daqui pouco tempo já estarei morto, mesmo porque, de natureza frágil, adoeço com facilidade. Além disso, pouco sofro com as crises econômicas, ou de guerra. Na verdade, se fosse para temer alguma coisa, o que mais temo são catástrofes nucleares, pois que essas circulam pela atmosfera. Mas, nem isso temo realmente, é só uma especulação. Logo, considero-me um otimista, sem preocupação com o futuro, ou pelo menos com o meu futuro. E se descrevo o que está ruim da pior forma, é porque sei que o que está ruim pode piorar. Não torço por isso, apenas observo e relato o que vejo do alto da minha insignificância. E o que sei é que o homem está semeando hoje uma catástrofe imunda para o futuro, que deixará todos atolados no lixo e na merda.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Terra à vista!

Olhe para frente, olhe para os lados, depois olhe para trás, e se não avistar alguma terra em nenhuma direção, posso garantir, merda é pouco para a sua situação.

Um princípio

Considero que todos têm o direito legítimo de viver com sua imundice com toda dignidade. Desfruto deste direito sem muito esforço; de todos direitos, o mais fácil de desfrutar, basta nada fazer. E eu surto com o barulho da limpeza alheia, aquelas faxinas que ligam os diabólicos eletrodomésticos logo cedo, despertando-me do sagrado sono a que todos temos direito. Ruído é uma sujeira que não aprecio. Como realizaram a loucura de comprar tamanho disparate de instrumentos, não sei. Sei apenas da loucura que é toda vez que se utilizam dessas máquinas escravizantes, seja no carnê da prestação, seja no seu uso diário.

Numa reunião social

Fui convidado para uma reunião social na casa de um amigo. Lá encontrei vários conhecidos e pessoas novas. Uma dessas pessoas ficava perguntando que tipo de macho cada homem seria. Tentei fugir o quanto pude de responder tal questão, mas quando fazia menção de sair da roda, um amigo fez questão de lembrar:
 - Falta Alguém responder o tipo de macho dele.
Sendo inevitável o confronto, pus-me a expor a questão do meu modo. Disse que, em primeiro lugar, não era um macho, mas antes um reles homem com todas as idiossincrasias que isso acarreta. Em segundo lugar, se fosse possível ser um macho, não seria do tipo alfa, aliás, de qualquer letra, afinal sou contra a reprodução. Em terceiro lugar, essa coisa de macho é coisa de pessoas inseguras de sua sexualidade. Em quarto lugar, mas não menos cruel, afirmei que os poucos machos que conheci, andavam de quatro. Ao fim, chamou-me de bicha, e todos riram. Depois muitos agradeceram a forma como encerrei a tola discussão.

Sobre autores

Aqueles que retiram palavras do lugar comum e usam para expressar suas idéias e defenderem suas posições, a estes é dado o nome de autor de palavras. E, no entanto, quanto não deve a tantos autores antes dele? Quantas idéias não lhe ocorreram se não tivesse lido este ou aquele outro autor? Os autores de palavras são úteis porque provocam outros tantos, que de tanto ler as merdas ditas por aí, já não teme vir na praça e falar as próprias.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Da série pensamentos evacuados

Os tolerantes que agüentem o peido alheio; eu mal suporto o meu............

Não me joguem na vala comum!

Não coloque rótulos em mim, sou um frasco muito liso para que grudem. Não me defina, nem sequer expresse julgamentos, cometerá equívocos. Nunca me estabilizei num conceito, nem sequer num nome, já tive vários durante a vida; muito menos busque algum enquadramento social para mim, logo eu que sou tão socialmente insociável.
Não me venha querer colocar em algum rebanho, seja torcendo por um time, seja por um candidato ou mesmo alguma religião: tenho erros próprios para serem cometidos. E detesto a multidão trotando pelos lugares, cega e surda a tudo que não seja seu interesse particular, passando sem me cumprimentar, ignorando a minha humanidade, passando por mim como se fosse algum tipo de obstáculo.
Como então devo ser visto? Como alguém sem adjetivos, que tem mais substância que qualidades, aquele que atravessa a merda da vida falando das cagadas humanas.  Enfim, devo ser visto como alguém que tem um futuro, além do passado e do presente, de merda! E veja que nisso sou muito parecido à grande maioria.... Há tão pouca originalidade entre as pessoas, apenas diferenças miúdas e epidérmicas que procuram engrandecer diante do pouco exigente mercado de afetos, que não poucas vezes compra gato por lebre.
Meu grande destaque é nada ter a ser destacado. Alguém comum, mas por ser diferente de uma ervilha, pensa. Uns se consideram incomum pelo seu físico, outros pelo seu profissionalismo, outros pela inteligência, uns por serem honestos, outros por serem leais, outros tolerantes, e tantas outras qualidades que se encontra no dicionário, enquanto eu, se não anuncio qualidades, também não escondo meus infindos defeitos. Sou tão humano....
Fiz muito esforço para ser ninguém. Tentações não faltaram para desviar-me da minha trajetória ininterrupta a ser alguém não afamado, não assalariado e um não consumidor contumaz. Um homem comum e cidadão do mundo é o que ambiciono para mim.

Notas sobre o meu existir N° 10

Não pense que é fácil relatar o ocorrido. Reluto em lembrá-lo, descrevê-lo é quase um masoquismo. Mas, a verdade tem lá seu encanto, ainda que no mais das vezes nos desencante com a crueza dos fatos escancarados em suas miudezas tão humanas.
Enfim, na terceira hora entrou o monsenhor em sua pose triunfante de quem tem a força do castigo nas mãos, seguido de um séquito de parasitas a concordarem submissos com todas as suas observações.  Estranhei carregarem todos os livros que mantinha no meu claustro. O texto manuscrito e ensangüentado encontrava-se nas mãos do padre vigilante, meu chicote imundo de tantas baratas mortas também estava, além de alguns cadernos de anotações.
Monsenhor, sem pedir licença a ninguém, começou a falar.
- O padre professor passa bem e lembra vagamente do que ocorreu. Sua única certeza é que este infeliz – apontando nitidamente para mim – levantou uma tese absurda de que se faz bem a um cristão ao matá-lo. Depois ele lembra que a turma estava dividida entre se concordava ou discordava dessa heresia. Logo após foi atingido e acordou diante do médico. Bom, meus caros seminaristas, quem concorda com o ponto de vista deste indivíduo, levante a mão!
Nenhuma mão se levantou, a não ser, é claro, a minha. O monsenhor olhou com rancor, ou até mesmo ódio, para mim e disse:
- O senhor tem alguma coisa a dizer?
- Gostaria de saber o que está acontecendo.
- Então você não sabe? O senhor provoca uma tragédia, que só não foi maior graças à intervenção divina, e não sabe o que está acontecendo?
- O senhor vai me desculpar, mas nada provoquei. E a graça divina, se existiu, foi pífia, poderia ter impedido o ocorrido, caso quisesse ou achasse necessário. Não fui quem atingiu o professor, nem nada ordenei nesse sentido, basta interrogar meus colegas. Apenas, defendia uma leitura heterodoxa das escrituras, fundamentada na Carta Acerca da Tolerância de Locke......
Ele gritou:
- Basta, chega de autores não católicos! Basta desta argumentação demoníaca! Olhem o que encontramos entre as coisas desse pecador insaciável: O Livro Negro do Satanismo, Malleus Maleficarum, naturalmente, na sua vulgata portuguesa “Manual da Caça às Bruxas”, pois até o momento é uma nulidade em latim, Corpus Hermeticum e Discurso de Iniciação de Hermes Trismegistos, O Livro dos Mortos do Antigo Egito, O Grande Alberto, História da Magia.....
Interrompi o monsenhor.
- Mas, senhor, esses livros são em decorrência dos estudos que estou elaborando em colaboração com o professor de História.....
- Cale-se!
Dirigiu-se ao professor de história e indagou:
- É verdade?
- Sim, ele está fazendo alguns apontamentos para mim, auxiliando-me nos meus textos didáticos.
- O senhor tem certeza que ele usa esse material apenas para suas pesquisas, não fará ele, secretamente, uso indevido desse material, cultivando um culto secreto ao escuro, ao demônio?
- Para ser honesto, não acredito. Ele simplesmente não acredita em nada, mas lê sobre tudo.
- Devo entender, então, que o senhor o está defendendo. Mas, está fazendo uma acusação ainda mais grave ao seminarista, pois não só não cultiva deus, mas nada, sendo, portanto, um ateu incurável, é isso que devo entender?
- Bom, se for para recriminá-lo, diria que ele nem ateu é. Para mim, ele nem se dá ao trabalho de querer destruir a crença dos outros. Ele é um indiferente com as questões religiosas e só as estudas para se divertir com aquilo que classifica da infinda ignorância humana. É fundamentalmente um cínico, epígono de Diógenes.
O monsenhor ficou meio perplexo. Parte de suas certezas foi por terra. Calado, olhava para os demais para saber que rumo dar as “investigações”, ou seja, estabelecer um culpado e uma pena. Um murmúrio corria a sala onde estávamos. Foi, então, que meu padre confessor se manifestou.
- Senhores, verdade que não avistaremos nenhuma das virtudes cristãs de forma típica nesse seminarista, mas acredito que não é capaz de provocar ou mesmo cometer vícios, com exceção, talvez, da leitura. Certamente, não mata, não rouba e não mente. Aliás, sua honestidade é o seu maior defeito. Creio que devemos começar a interrogar os alunos, separadamente, para tentar entender o que ocorreu. Mas, devemos interrogar o acusado em primeiro lugar, antes de tentar atribuir-lhe uma culpa que não lhe cabe e correndo o risco de nem descobrir o erro que cometeu.
E aqui sim começa a parte cruel, quando todos os seus colegas saem, e você só, diante de quinze ou mais inquisidores, tem que responder várias perguntas simultaneamente, todas ardilosamente feitas para te confundir. Arcaicamente acreditam que a verdade brota da dor e aplicam os suplícios nos infelizes que, por um motivo qualquer, muitas vezes banal, caem sob suspeita. Antecipo que resisti com todas as minhas forças, tanto quanto pude, ainda que, ao fim, sucumbi, como qualquer mortal diante da dor. Friso que a crueldade foi coletiva, pois cada um, trancafiado no seu claustro, sem escutar senão gritos dos supliciados, fica a imaginar o que o outro está contando, o que ele sabe sobre você e possa revelar para aliviar a dor própria, enquanto demoradamente espera a sua vez de ser interrogado. Muitos vomitam, mas a grande maioria, invariavelmente, se caga.

Pensando em você

Todo dia penso em você e em alguma coisa para ser escrita. Tendo a achar que há pessoas que esperam minha manifestação. Por isso dizem que sou um desocupado, que ao invés de fazer alguma coisa útil, findo constrangendo alguém com meus escritos fedorentos, e aumentando a desocupação alheia, já que por vezes abandonam o trabalho pelas besteiras aqui escritas. Se consigo afastar as pessoas do trabalho, não sei, mas todo esforço é para esse intento. Sou um franco defensor do ócio criativo. Assim, pensando em você, venho quase todos os dias falar alguma merda, para que a identifique e não pise, e nem tanto para evitar sentir a fedentina, que é inevitável, afinal, a sabedoria tem lá seus odores.