Dentre as
inúmeras incoerências humanas, a justiça merece destaque pelas injustiças que
vem promovendo nos ingênuos humanos. Contrariamente ao que afirmam a maioria
dos pensadores há milênios, não é porque temos o sentimento de justiça, ou a
desejamos, ou mesmo por sermos justo, que se criou a justiça, ou por causa de
bons sentimentos, ou porque os bons pretendem limitara o poder dos maus, mas
porque se têm medo se sofrer injustiças. Não são para as virtudes que se deve
olhar para entender a origem da justiça, mas essencialmente para a sua falta,
além dos vícios.
Foi graças às
pessoas más que se criaram as leis, foi para conter a maldade ou a ganância que
elas foram inventadas. E não necessariamente foram as pessoas boas que as
fizeram, pois mesmo os maus não querem sofrer injustiças e têm interesse que
haja justiça, apenas se acham no direito de eventualmente não praticá-la.
Enfim, a justiça foi inventada porque as pessoas são injustas. Uma justiça de
homens maus nunca pode dar em boa coisa.
Fossem os
homens bons, honestos, não violentos e justos, então, a lei seria
desnecessária. E a razão porque os homens não são assim é simples, basta por a
mão na consciência e saberá quantas injustiças se escondem em nossos desejos.
Ora, o certo todos sabem, tanto que só realizam as coisas erradas escondidos,
clandestinamente. E assim, toda grande injustiça social decorre apenas das
pequenas injustiças individuais, e jamais se consertará qualquer coisa no
mundo, sem antes de consertar a si.
O fato é
que, por simples e fácil saber o que é certo, não acarreta que seja fácil e
simples praticá-lo, pois ainda que seja algo desejável de receber, poucas vezes
parece conveniente realizá-lo. Por exemplo, ainda que o certo seja dizer o que
se pensa, por vezes é preferível calar, ou então falar diferentemente do que se
pensa. Assim, por desconfiança mútua, por nos acharmos incapazes de ter boa
vontade de praticar o certo, e que o interesse próprio sempre pode prevalecer
sobre o interesse comum, que criamos leis coercitivas para obrigar a todos, ou
pelos menos a maior parte, não a fazer o certo, mas a cumprir a lei; não é das
pessoas propriamente que se espera a justiça, mas do cumprimento da lei pelas
pessoas. E os que não se contém e descumpre a lei, punição.
Afinal, a
justiça é apenas o primitivo sentimento de vingança disfarçado, pois quando se
sofre alguma injúria, deseja-se ao injusto o pior dos castigos. Eis porque
muitos acham as leis brandas, já que o desejo majoritário é que o injusto
morra. Não se deseja discutir o que é justo ou apropriado para aqueles que mais
seguem suas inclinações do que sua razão, e não cumprem o dever da lei, querem
apenas punir a pessoa por isso. Entretanto, o mal sofrido pode ter origem
diversa, da ignorância, do medo, do equívoco, da insensibilidade e até mesmo da
maldade; a punição, a vingança, se for eficaz, o que não acredito, só se aplica
à maldade. Punir a ignorância é crueldade, visto que a ignorância já é o pior
castigo que alguém pode sofrer. Punir o medo, o aumenta, não o elimina. Punir o
equívoco é inútil, pois ninguém escolhe se equivocar, é algo involuntário que
ocorre a todos. Punir a insensibilidade apenas aumenta a mesma. Já a maldade
pode justificar a punição e a vingança, mas dificilmente a legitima.
Na realidade
toda injustiça começa ao se querer estabelecer a justiça: via de regra, os mais
fortes imporão aos mais fracos seus critérios, seus princípios, mas
principalmente sua vontade. E é do exercício da força de uns sobre os outros,
que surge a tola noção que se pode estabelecer uma justiça entre fortes e fracos,
ou que haja um exercício legítimo da força, quando a força, em si, é violência,
ou seja, injustiça. E como, ainda que fraco, um homem é um homem, é capaz de
subjugar a força, ou enganá-la, os conflitos dos homens se estendem pelos
séculos.
Desconsiderando
a hipótese de alguma má índole de origem biológica, suponho que as mesmas se
construam culturalmente, e assim como viemos formando índoles boas e más no
decorrer dos séculos, o fato é que fundamentalmente se plasmam índoles
ignorantes, fracamente ilustradas, deficientemente educadas, aptas apenas para
captar tudo que o desejo lhe apresenta e não olha para nada. Construindo
pessoas justas haverá justiça, do contrário, ainda que não se plasme
necessariamente pessoas injustas, as mesmas agindo apenas atrás dos seus
interesses, faz de quase todos pessoas interesseiras, que é o que mais promove
as infindáveis injustiças que se sofre e que se pratica cotidianamente, das
menores às maiores ações promovidas.
Mas o justo
não pode ser estabelecido por leis; ele se estabelece em cada momento e em cada
circunstância de forma diversa, eis porque as leis fedem ao querer estabelecer
o certo para todos: cria o errado para muitos. Desse errado, logo se passa a
ser considerado ilegítimo, para depois ser injusto, e por fim punido. De um
lado a lei pressupõe uma pessoa que a entenda e que a cumpra, mas desconfiando do
entendimento e da obediência de todos, estabelece também punição para os
desobedientes. Por outro lado, a lei que estabelecem direitos e deveres
pressupõe que todos desejam os mesmos, ou que é necessário a todos. Por fim, a
lei pressupõe que os homens são incapazes de fazer o certo e o justo sem a
coerção da espada que lhe acompanha. As três pressuposições estão equivocadas.
Para
começar, considero a premiação mais eficaz para induzir alguém ao certo do que
a punição. Deve-se contar antes com o interesse da pessoa, do que com a sua boa
vontade, pois ainda que a mesma possa ser desejada, não deve ser esperada; o
que move a todos são os interesses, e mesmo a boa vontade, carrega consigo
algum interesse. Além disso, se pressupor que as pessoas entendam e cumpram uma
norma, a mesma deixa de ser norma: o que falta é entender a norma, e não punir
aqueles que não entenderam, visto que qualquer pessoa normal, se entende o
espírito da lei, a necessidade e a justiça da mesma, raramente a desobedecerá.
Por fim, direitos e deveres me parecem um arcaísmo feudal, de senhor e escravo.
Um homem livre deve seguir suas próprias leis, não se submeter às leis externas
e criar leis comuns.
Como obter
pessoas justas antes de construir tribunais de justiça é uma questão elementar,
é só usar a educação para ao invés de deformar os homens para serem tão somente
profissionais e consumidores, e transformá-la em formadora de cidadãos da
humanidade e habitantes do planeta. É óbvio que não se pode ser ingênuo que
isso impedirá a ocorrência de qualquer ato injusto. Há pessoas patologicamente
más e injustas que educação alguma conserta. Pessoas mesmo bem educadas podem
se equivocar, podem ter ignorâncias para algumas circunstâncias ou em alguns momentos.
As pessoas também podem se iludir e se enganar. A grande diferença entre uma
pessoa formada para ser justa, daquela deformada para reivindicar justiça dos
outros, é que a primeira tem a possibilidade de perceber o erro e agir para o
seu acerto, se sente parte do processo da realização da justiça, além de
recepcionar as ações alheias não como injúrias a serem punidas, mas como
ignorância a ser remediada. Enquanto a segunda apenas sabe alimentar mágoas
sobre supostas injúrias recebidas, e requer a força para obter alguma
compensação.
Para mim a
justiça de retribuir o que se recebe só é válida quando se retribui o bem,
nunca o mal. O mal jamais se retribui, pois o mesmo só se anula no exercício do
bem, e jamais com a eliminação de pessoas supostamente más. Quanto mais as
pessoas são boas, menos pode o mal agir, e quanto mais as pessoas são mal
formadas, mais o mal pode reinar, principalmente de forma involuntária.
Devemos ter
em conta que a justiça tem sido sempre uma coisa que interessa aos fracos, pois
como os fortes não se submetem, raramente sofrem injustiças. Mas, podem
praticá-la, não por alguma maldade intrínseca, porém ao seguirem sua vontade
institui seu interesse aos fracos. Há os que condenam a existência dos fortes,
entretanto, se for para condenar alguma coisa, condenem-se os fracos, pois a
força só pode ser exercida sobre a fraqueza, enquanto a força contra outra
força se equilibram. O que faz pender a bandeja da justiça para os fortes, não
é apenas a ação dos fortes, mas também a submissão dos fracos. E os fracos ao
invés de buscarem ser fortes, querem limitar o exercício da força, que faz que
a força extrapole os muros de contenção aqui e ali; nada que é forte tende a
ficar inerte. O fraco tem medo de tudo e tudo quer proibir, limitar, controlar,
submeter, procurando uma segurança inexistente, como se pudesse conter o
desenvolvimento humano, a corrente dos movimentos históricos, os pulos do
conhecimento e da ousadia de agir de qualquer pessoa forte, que tem coragem
para saber e não tem preguiça para empreender. E por mais que se faça, o forte
fará a sua justiça e não se submeterá à justiça dos fracos. Não é tanto que a
justiça do forte seja tirânica, mas antes não se submetendo a nenhuma
injustiça, só realiza aquilo que acha certo, e que pode ser considerado errado
pelos fracos.
Todavia, só
há igualdade quando nos fazemos iguais, não quando queremos que as pessoas
sejam homogeneizadas pelas leis. Só há liberdade quando se exerce a liberdade;
ela não é um direito, é uma opção pessoal que não se dá ou se tira. Assim como só
há justiça quando se busca ser justo, mesmo que nem sempre se consiga. Leis externas
aos homens, estabelecidas em constituições, ainda que possa ser considerada uma
conquista da civilidade, é antes um atestado de incompetência educativa, para
ensinar a agirem de forma ponderada, com leis próprias quando se trata de sua
vida e seus interesses, e segundo leis de respeito mútuo, quando relacionada
aos demais.
Mas, enfim, pode a humanidade algum dia ser
justa? Ou talvez seja melhor perguntar, pode a humanidade deixar de ser
injusta? A essa questão cada um deve dar a sua resposta. De minha parte posso
garantir, antes de ser justo, procuro não ser injusto, pois achar que se pode
ser justo sempre, impede de ver as injustiças que se comete involuntariamente,
e procurando não ser injusto, se não sou justo, ao menos cometo menos
injustiças, ou tenho essa esperança.... ou ilusão.....
Aqui se evacuam idéias e comentários sobre a porcaria humana
sábado, 20 de abril de 2013
sábado, 13 de abril de 2013
Declaração Universal dos Deveres Humanos
É com certo tédio e asco que constato que desde a Revolução
Francesa até hoje tem se tentado instituir os Direitos Humanos. Deixando de
lado as boas intenções que isso envolve, e o fato que aqui ou ali haja maior ou
menor respeito aos mesmos, o fiasco na sua plena obtensão se deve
essencialmente por ser o direito um fim fácil de entender e mais fácil ainda de
desejar, todos querem, sem perceberem que todo fim necessita de meios para
serem obtidos. Ou seja, um direito aqui exige um dever ali, não havendo direitos
se não houver antes o cumprimento dos deveres: antes que ausência de direitos,
que é uma consequência, a humanidade sofre por descumprimento dos deveres. Enfim,
as pessoas precisam ser educadas para entenderem os deveres, assim como
desejá-los, antes que sair por aí bradando por direitos, que muitas vezes são
tão somente privilégios. É preciso aprender que há beleza, prazer, felicidade e
satisfação no cumprimento dos deveres, do contrário, podemos caminhar para uma
triste tirania dos direitos.
Assim, no intuito de contribuir com esse processo educativo da humanidade para os deveres e do alto da minha insignificância digna, venho propor essa singela Declaração Universal dos Deveres Humanos, esperando com isso fornecer instrumental necessário para se iniciar um processo educativo de crianças e adultos, menos infantil e que atende apenas os desejos, por uma educação madura que desenvolva a responsabilidade por si e por todos os demais, como membros da humanidade. Antes de cobrarmos o cumprimento dos direitos, deve-se exigir a realização dos deveres, só assim os direitos reinarão.
Naturalmente, ao se cumprir com os deveres
humanos, os direitos humanos aflorarão espontaneamente, e a luta para a sua
implantação não mais será necessária, substituindo a coerção e punição legal
para o respeito do direito, pela força da inteligência direcionando a vontade
esclarecida. A luta pelos fins tem que ser conjunta com a luta pelos meios, e
não se pode desejar o fim – o direito, sem desejar igualmente os meios – os deveres.
No mais, apenas esperar que a humanidade de um salto ético e não apenas
quântico.
Assim, no intuito de contribuir com esse processo educativo da humanidade para os deveres e do alto da minha insignificância digna, venho propor essa singela Declaração Universal dos Deveres Humanos, esperando com isso fornecer instrumental necessário para se iniciar um processo educativo de crianças e adultos, menos infantil e que atende apenas os desejos, por uma educação madura que desenvolva a responsabilidade por si e por todos os demais, como membros da humanidade. Antes de cobrarmos o cumprimento dos direitos, deve-se exigir a realização dos deveres, só assim os direitos reinarão.
1. Todo ser
humano tem o dever de preservar a vida humana, animal, vegetal e mineral, assim
como a própria vida, não sendo um parasita social, esbanjador, destruidor ou
porcalhão.
2. Todo ser
humano tem o dever de ser honesto no que diz e nas suas trocas, não se
admitindo a desonestidade nem com os desonestos, nem para preservar a própria
vida.
3. Todo ser
humano tem o dever de lutar e defender a justiça, a liberdade e a paz.
4. Todo ser
humano tem o dever de respeitar a forma de viver, pensar, sentir e agir alheia,
quando a mesma não ameace ou desrespeite ninguém, e seja realizada voluntariamente,
nem esteja obrigando nada a ninguém.
5. Todo ser
humano tem o dever de participar virtuosamente da vida política e cultural de
sua nação, de forma a contribuir para o aperfeiçoamento e emancipação própria e
dos demais. A omissão e a apatia são condenáveis como infantilidade e
desresponsabilização para com a humanidade.
6. Todo ser
humano tem o dever de ser fraterno, solidário, hospitaleiro e tolerante.
7. Todo ser
humano tem o dever de tentar se aperfeiçoar e se esforçar por ser uma pessoa
melhor.
8. Todo ser
humano tem o dever de perdoar quando o outro mostra arrependimento.
9. Todo ser
humano, se rico, tem o dever de ser liberal com seus bens e contribuir com a
comunidade, com as artes e com as ciências; se pobre, envidar esforços para
adquirir independência financeira e autonomia.
10. Todo ser
humano tem o dever de respeitar as diferenças de gênero, de idade, de cor, de
etnia, aspectos físicos, até mesmo as deficiências.
11. Todo ser
humano tem o dever de ter a preocupação de ser bom antes de cobrar bondade
alheia.
12. Todo ser
humano tem o dever, na procura dos seus interesses, de medir, calcular, julgar
e tentar perceber se os mesmos não prejudicam alguém ou não se contrapõem ao
interesse comum.
13. Todo ser
humano deve buscar a emancipação de todo ser humano, desde a mais tenra
infância, criando condições para o desenvolvimento pessoal de todos.
14. Todo ser
humano tem o dever de ajudar o próximo, exercitando a piedade e a caridade.
15. Todo ser
humano tem o dever de não cobiçar mais do que precisa, nem desperdiçar o que tem.
16. Todo ser
humano tem o dever de não matar, não mentir e não roubar como uma obrigação da
racionalidade, e não apenas como um mero limite legal.
17. Todo ser
humano tem o dever de procurar praticar seus deveres com tanto fervor quanto
deseja usufruir seus direitos.
18. Todo ser
humano tem o dever de mais do que respeitar os direitos humanos, contribuir
para o seu aperfeiçoamento, envidando esforços para torná-los princípios de
ação e reflexão, antes que fins interesseiros de pessoas desejosas de
privilégios e regalias.
19. É dever
de todos não ser uma ameaça a ninguém, seja do ponto de vista físico, moral, psíquico
ou espiritual.
20. Todo ser
humano tem o dever de lutar por ser justo, antes de lutar por justiça.
21. Todo ser
humano tem o dever de ousar saber ou buscar a verdade, tendo coragem de
abandonar antigas verdades, assim como não ter preguiça para buscar novas, pois
que todo conhecimento necessita de algum esforço.
22. Todo ser
humano tem o dever de fazer uso adequado do seu entendimento, buscando entender
o outro, antes do que condená-lo.
23. Todo ser
humano tem o dever de procurar estabelecer uma harmonia entre a vida individual
e a vida coletiva.
24. Todo ser
humano tem o dever de se autoeducar desde a infância até o fim da vida, buscando
se conhecer melhor e fugir da ignorância, das superstições e dos medos.
25. Todo ser
humano tem o dever de morrer pela verdade, pela liberdade, pela justiça e pela paz, sem com
isso adquirir qualquer direito de matar por essas causas.
26. Todo ser
humano tem o dever de entender que é sempre preferível sofrer o mal que
praticá-lo, e que deve mais lamentar o mal realizado, que o mal sofrido.
27. Todo ser
humano tem o dever de respeitar a religiosidade ou a falta de religiosidade,
pois que são questões indiferentes, desde que a pessoa seja justa.
28. Todo ser
humano tem o dever de estabelecer deveres para si próprio e para os demais,
desde que não seja por imposição ou tiranicamente.
29. Todo ser
humano tem o dever de se esforçar por sua felicidade, sem esperar dos demais
sua obtensão.
30. Todo ser
humano tem o dever de se esforçar com o fim dos deveres, e que tudo de certo e
justo seja apreendido por exercício intelectual e criação de disposições nas
pessoas, mais do que por algum tipo de obrigação ou coerção.
quinta-feira, 11 de abril de 2013
Da série pensamentos evacuados
Os homens, em geral, se têm em tal conta, que
qualquer elogio parece merecido, e qualquer crítica parece ofensa. É que a
vaidade é muita e a sabedoria pouca, eis porque as pessoas querem mais honras
que as merecidas, mas ao fim se satisfazem com algum dinheiro. É claro, tudo
que tem preço não vale nada.
A crise contemporânea
Afirmam que estamos em crise. Não apenas uma
crise econômica, o que é usual e cíclica, mas uma crise de valores, morais, de
costumes, da família, da religião, das instituições, da política, enfim, uma
crise geral, ampla e irrestrita. Mas, em que momento a humanidade não se
lamentou de crise, do fim de uma cidade, de uma região, de um império, de uma
época, da juventude não querer seguir os antigos costumes? Estar em crise é a
situação por excelência que a humanidade sempre se encontra. E nem poderia ser
diferente: cada novo indivíduo que adentra ou surge nesse mundão que cada vez
mais se estreita com o contato mútuo, pode engendrar novidades, questionar o
antigo. Ainda que se nasça num mundo já feito, cada um de nós é capaz de inaugurar
coisas que modificam tudo, até mesmo os valores. Afinal, por que as novas gerações
deveriam seguir a viver segundo padrões das gerações anteriores, principalmente
ao se constatar as tolices dos antigos, seus preconceitos, suas superstições e
medos? Deve o novo ficar escravizado às deliberações anteriores à sua
existência? Deve o homem contemporâneo se subordinar aos valores dos
antepassados? Pode uma geração escravizar a próxima com suas determinações, ou
não deve, ou pode, os novos vislumbrar novos horizontes e engendrar algo diferente? O fato é que só vê
crise quem acredita que as mudanças não devem existir, ou acredita que qualquer
mudança é para pior, ou ainda aqueles que temem perder seus privilégios ou
postos sociais, ou a autoridade, o poder, ou o dinheiro. Mudar é bom, importante,
necessário e sinal de algum tipo de racionalidade, capaz de perceber os
equívocos passados e agir para, senão consertar os erros, procurar outro
caminho onde se evita velhas receitas para problemas novos. O que sempre
ocorreu e ocorre é que o novo sempre assusta, pois mesmo não questionando o
antigo diretamente, impõe modificações no sentir, pensar e agir, e o que
parecia sólido e estabelecido aparecem com sua face real, como algo mutável, questionável,
transformável, como tudo que se relaciona com o ser humano. A única coisa
imutável é a mudança, não como uma obrigação, mas como uma consequência
necessária do aprendizado humano.
terça-feira, 9 de abril de 2013
Minha descrença é mais profunda
Há aqueles que não acreditam em cristo, o que
para mim é indiferente sua existência ou não, visto que tirando os cristãos,
ninguém leva a sério esta estória de messias. Não acredito é em cristão. Naturalmente,
inúmeros professam supostamente sua crença, sua fé, essa coisa meio primitiva
que a humanidade carrega como um arcaísmo persistente, nesse ser, porém poucos
de fato levam a sério ou a risca o que promulgou. Em primeiro lugar, a morte é
um bem, nos aproxima de deus, quando os mortais se livram da carne sedenta e
pecaminosa sempre a cobiçar o que não deve, ou mais do que deve, e a alma,
liberta do corpo e suas nefastas inclinações, adentra no paraíso. Sendo assim,
ao matar um cristão não se faz mal a ele, pois o aproximamos de deus, o que de
forma alguma é um mal, a estar certa a tradição cristã. Nem fazemos mal a sua
família e dependentes, sendo eles cristãos, pois todos deveriam sentir que foi
uma melhora, uma ascendência da indecência humana pecaminosa que beneficiou o
falecido. E o que deveriam sentir essas pessoas que perderam o ente querido? Raiva?
Não! Pena! Piedade, isso é que manda o cristianismo sentir com os que praticam
o mal. Mas, não! Não um mal contra outro, mas contra si mesmo, pois o assassino
comete um mal contra si mesmo (ainda que tenha matado outro), e a estar certa a
tradição, arderá no inferno. A morte nunca prejudica o morto. Além disso, como
diz os textos supostamente sagrados, não se pode fazer mal a alguém protegido
por deus. Logo, o que um bom cristão deve sentir? Pena, ser caridoso com alguém
que sofrerá eternamente o mal cometido. Deve os cristãos julgar outros cristãos
ou homens? Não! O julgamento é prerrogativa de deus, que pode até perdoar um
assassino, desde que o mesmo mostre arrependimento. E como poderá os homens
condenar se deus pode perdoar? Em segundo lugar, instrui os mandamentos que o
cristão seja caridoso e que trate a todos como irmãos, mesmo o estranho, o
diferente, até os adversários, e mesmo o mal deve ser retribuído com o bem, e
até mesmo um bandido deve ser tratado como um irmão a ser convertido, e não um “satanás”
a ser condenado. Em terceiro lugar, manda que se morra pelo certo e justo, mas
que jamais se mate por eles, que não se deve matar nem em legítima defesa, pois
o único que pode tirar a vida é deus. Poderia continuar a enumerar outros
inúmeros princípios cristãos e revelar como os autointitulados cristãos nem de
longe cumprem, ou querem cumprir, ou até mesmo pensam a respeito; acreditam que
ir na igreja, engolir hóstias, ou rezar é suficiente para serem considerados
crentes. Quando vejo quase todos cristãos temerem a morte, saírem por aí a
condenar os comportamentos diferentes dos seus, a quererem proibir os demais de
seguirem suas crenças, a professarem e praticarem o que acreditam, condenando
tudo como obra de satanás, vejo que cristo é apenas o pretexto para exercerem sua
arrogância de saberem o que é certo para todos, ou pior ainda, consideram que
sabem o que deus quer e são seu porta voz. Deus mandou serem tolerantes, mas a
maioria dos cristãos é intolerante; deus mandou não matar, mas a maioria dos
cristãos acha que pode matar nas guerras, pela polícia ou em legítima defesa,
ou por alguma causa “justa”; deus mandou ser caridoso, não dando esmolas, mas
ajudando quando possível, sendo tolerante quando necessário, sendo justo não
julgando, mas entendendo; deus ordenou que sejam piedosos até mesmo com os
injustos e os maus. Enfim, o que a mensagem de cristo diz e o que os homens
fazem, interpretam, deturpam, pervertem, subvertem e sei lá que mais coisas
feias fazem com uma mensagem, tola, utópica, é verdade, mas que não deixa de
ter alguma civilidade, é algo que deveria ser levado mais a sério pelos
cientistas sociais. Eu que não sou cristão fico apavorado com as interpretações
que fazem do texto bíblico, que por mais tolo que seja, as pessoas conseguem
torná-lo ainda estúpido.
sábado, 6 de abril de 2013
O pastor deputado, o deputado pastor, ou nem um nem outro, apenas o ofensor Marco Feliciano
O Sr. Marco Feliciano é uma figura interessante.
Quando expressa seus preconceitos e ofende os demais cidadãos, se defende ora
na liberdade de religião, ora na imunidade política, arrogando-se privilégios
que falsamente denomina direito de expressar sua opinião tola. Se ofende alguém
ou algum setor social, defende-se alegando que fala como pastor; se é imoral,
alega a imunidade parlamentar para não ser punido pela opinião difundida. Para mim,
esse senhor não serve nem para ser pastor, pois não evangeliza as pessoas,
antes julga e condena os que professam outras crenças como satânicos e
malignos, muito menos serve como deputado, pois que usa do cargo público para
defender os interesses privados de sua igreja. Nem ao menos acredito que seja
cristão, pois sem piedade e misericórdia condena os supostos pecaminosos, ou
seja todos que não se ajoelham na sua igreja, quando deveria antes ter pena;
até onde li da Bíblia, Cristo diz: “Perdoai, eles não sabem o que fazem!”, e
não “Condenai, é tudo agente de satanás!”. Para ser honesto, não conheço cristãos
de fato, apenas farsantes prontos a condenar e jamais perdoar as ofensas (ou
supostas ofensas, pois a pessoa pode se sentir ofendida sem ter sido) recebidas;
a condenar antes de ser piedoso, de cobrar antes de ser caridoso, e a prova
mais concreta da falta de crença dos cristãos, quase todos temem a morte, nada
mais anticristão. De resto, devo dizer que o Sr. Feliciano ofende antes de tudo
a minha inteligência com sua opinião, suas posições políticas e religiosas, e
com sua imoralidade de se esconder atrás de prerrogativas legais, para cometer
suas ilegalidades opinativas, de usar o poder legislativo para impedir os
demais, minorias ou não, de adquirir direitos para também realizar sua vida
segundo suas crenças, assim como ele o faz, mas que ele quer impedir que os
demais façam.
quinta-feira, 31 de janeiro de 2013
Salvem-se!
Ó destino,
qual o seu destino? Se intrometer no destino de todos... Mesmo aqueles que
acreditam ter sob suas mãos seu futuro ou seu presente, lá vêm o destino e
intercede em qualquer direção, nem planejada, nem querida. Só aqueles com
virtudes enfrentam o destino e até mesmo o acaso no caminho sempre pretendido
da felicidade. E se não a encontram, ainda assim não ficam infelizes, pois
ainda que por vezes não tenham forças para atravessar o mar bravio das
dificuldades, não se afoga nelas, navegando entre ilhas na direção certa, mesmo
sendo incerta a sua chegada. Ó navegantes, saibam aproveitar as marés, as
correntes, os ventos, mas não se esqueçam de que também têm que remar, ou, se
bem habilidosos, construir um motor. De minha parte, posso garantir, a
felicidade é bem simples e bastante elementar, basta não pisar em ninguém, nem
se deixar pisar. Tudo mais se ajeita....
Ano Novo, Merda Antiga
Alguns poucos leitores perguntaram porque fiquei
tanto tempo sem escrever. Ora, com tanta bosta acontecendo, não quis aumentar a
fedentina com as minhas merdas. Enchente, dengue, gente e coisas sendo levadas
pelas águas, crimes e violências, guerras e barbárie pelo mundo, enfim, o mesmo
de sempre. Deveria falar daquela merda das falsas expectativas para o ano novo,
carregado de dívidas antigas, mas preferi me silenciar para não carregar o
estigma de ser um negativista, quando sou apenas realista. De que adiantaria
falar que o que mais se produz no natal é lixo, com as embalagens entupindo
bueiros, que a festa de fim de ano imundícia as cidades e que o cheiro de urina
pelas ruas é o perfume da alegria fútil de quase todos? Como tudo mais que
faço, pouco ou mesmo de nada serviria. Mas, voltei, como sempre, sem muito
entusiasmo, querendo fazer pouco, e sabendo do pouco valor de tudo que faço. Minha
única perspectiva com isso é provocar alguma diarreia mental, que se não enche
de sabedoria, espero, alivie alguma carga de ignorância.....
domingo, 16 de dezembro de 2012
Uma estranha função social
Sou um decifrador dos sinais, dos signos e dos
símbolos humanos, ainda que nem seja sábio, muito menos tenha competência em
alguma ciência. Tento traduzir a incompetência humana para a convivência pacífica,
seja consigo mesmo, seja com as demais criaturas, seja com a natureza para o
pouco entendimento das pessoas, que mais do que não saber, sentem asco pela
sabedoria e mergulham fundo na mais profunda ignorância. Confesso que não tenho
sucesso, nem mesmo êxito. O amor a ignorância é tão arraigado, a preguiça
mental é tão habitual, a falta de coragem para descobrir a verdade é tão forte,
que meus esforços na maior parte das vezes resultam em palavras faladas sem
serem ouvidas, ou odiadas, ou ainda desprezadas, o mais usual. Ainda assim
prossigo esforçadamente mostrando como o ódio decorre do amor, como a tristeza
é o resultado mais imediato da alegria, que a igualdade não passa de um símbolo
matemático, que a liberdade é responsável pela construção das prisões e que a
razão é uma ilusão e um mito recorrente quase tão antiga e arcaica como a
divindade. É que no mundo humano, quase todo formado de coisas não palpáveis
(amizade, felicidade, amor, poder, justiça, liberdade etc.) ou materiais,
ou tangíveis, coisas que não tem um ser específico, mas é antes uma forma de estar e agir, coisas
que só existem ou decorrem de estarmos entre homens, do contato entre as
pessoas, quando se fala alguma coisa, muitas coisas distintas podem ser
entendidas, assim, da mais inocente ação pode ocorrer repercussões
imprevisíveis e pode significar coisas muito diferentes, dependendo do nível
informacional dos receptores. Logo, quando digo que o problema político é
ético, que o crime é um problema de saúde pública e a saúde pública vem se
tornando caso de polícia, poucos entendem. De fato, dos símbolos inventados
pelo homem, o mais esotérico e exotérico, sem dúvida, além da certeza, está a
verdade, que sempre comportou inúmeras mentiras e infindas falsidades, pois
assim como dizem que há várias falsidades e formas de errar e só uma verdade e
uma forma de acertar, ocorre de não se acertar, nem verdades descobrir, visto
que a mentira sempre pode prevalecer. Sinais da ocupação humana do planeta: há
merda humana de polo a polo. Signos da ocupação humana do planeta: as línguas
diferenciadas que se escuta pelas diversas partes da Terra. Símbolos evidentes
do domínio humano do planeta: a produção cultural da humanidade. Sinais, signos
e símbolos são quem promovem o entendimento e o desentendimento, a emancipação
das pessoas ou sua submissão, a libertação ou escravização a algumas verdades e
as inúmeras mentiras, além da ocupação planetária. De resto, só peço que não interpretem
esses sinais, signos e símbolos, como se fossem “A” Verdade, mas que entendam
antes que expressam minhas verdades, que ainda que possam não ser verídicas,
são certamente honestas. Para encerrar, é preciso que se diga que, o que mais
simboliza nosso existir, sinal claro de nossa estranha permanência na
existência, signo unívoco de nossa inconsistência é o mito recorrente do fim do
mundo, que encanta e espanta o imaginário supersticioso dos homens e sua
consciência pesada há milênios, e nem o mundo nem o mito têm fim. O que todos
deveriam saber é que só uma forma de acabarmos com o mundo, excluindo essa
palavra dos dicionários dos homens, no mais só petulância simbolicamente
frágeis, repleta de signos com significações insignificantes e sinais confusos
da pressa de ocupar o silêncio do desconhecimento, já que não poucas vezes
querem explicar o que não sabem com coisas que sabem menos ainda.
quarta-feira, 7 de novembro de 2012
A merda brasileira
O Brasil não
tem problema, já o brasileiro é muito problemático. Sua elite ascendeu pelo
dinheiro, pela força ou pela violência, não por méritos políticos ou por
virtudes morais; assemelha-se mais a uma oligarquia do que a uma aristocracia. Sua
suposta elite intelectual ambiciona fama nacional para tentar conseguir glória (efêmera)
internacional. Mais do que inculta e ignorante, é fundamentalmente burra,
mesquinha e medíocre. Sinal claro disso é o lugar (ou não-lugar) da educação em
solo brasileiro, uma coisa improvisada desde sempre e, como tudo indica, para
sempre: segue os oportunismos governamentais, mais do que atender as necessidades
nacionais; sempre na mão de leigos, de apadrinhados, de amigos, de familiares,
de políticos, nunca na mão de educadores. O oportunismo e o improviso é a marca
mais significativa do espírito brasileiro. Não acredita no trabalho (ainda que
trabalhe como um burro), no estudo, no esforço, mas na sorte e nas relações
pessoais que trava para vencer na vida, nem que para isso tenha que cometer uma
ou várias canalhices. Suas virtudes morais são tão baixas, que basta ver alguém
simplesmente honesto, o que todos deveriam ser, para colocá-lo nas manchetes dos
jornais e televisões como herói, um modelo, não para ser seguido, pois no
Brasil poucos acreditam na honestidade como uma prática comum, mas para dar uma
leve expectativa que entre tantos bandidos, há ainda esperança de haver alguns
poucos que se salvam. O brasileiro tem a alma de garimpeiro, daquele que espera
fazer fortuna rápida explorando a natureza, sem se importar com os custos dessa
busca; tem um caráter covarde que o faz silenciar diante das injustiças ou
quando tem que agir para que ocorra o certo, que alienadamente delega ao
Estado, ou pior, ao governante realizar; é um preguiçoso quando se trata do bem
comum ou da coisa pública; é um pervertido moral, pois a moralidade é algo do
reino da aparência, nunca de essência, e o importante não é ser, mas parecer
honesto, bom e justo – via de regra, aquele que mais cobra moralidade é quase
sempre o mais imoral, e quer se qualificar, desqualificando o outro. Quando age
certo, dificilmente é pelo motivo correto, e quando tem um motivo correto, acha
que não precisa agir certo. Que alguns possam achar virtude numa aparente
alegria ou numa suposta cordialidade brasileira (que o digam os descendentes de
escravos, que muitos não encontraram até hoje um lugar descente para morarem),
ou ainda em algumas manifestações artísticas ou esportivas onde alguns
indivíduos possam se destacar, que não seja pelo dinheiro, pela força ou pela
violência os outros fatores que destacam os brasileiros para eles mesmos, tendo
a discordar, ou pelo menos relativizar a qualidade dessas virtudes, uma vez que
se continua a privilegiar as ações individuais, quando as verdadeiras virtudes,
ou pelo menos, as mais importantes não são aquelas que destacam os indivíduos,
mas aquelas que são produzidas em conjunto com os demais, aquelas que se faz
entre homens como a amizade – não a cumplicidade como se entende em solo
brasileiro a amizade; a coragem de enfrentar as adversidades e as injustiças; a
justiça de saber agir de forma certa no momento apropriado, antes que a
vingança por maldades supostas; a sabedoria para moderar sua razão e suas
emoções, de forma geral, imaturas e tolas. Tenho para mim que o brasileiro é um
cagão, não só foge da luta, mas se caracteriza pelo famoso “deixa disso”,
acredita que deve entregar tudo quando sob a mira de alguma arma, que uma
prolongada vida covarde é infinitamente melhor que uma breve vida heroica, que
nada nem ninguém valem qualquer gesto digno de sua parte, que se deve se ajoelhar,
seja aos poderosos, seja a qualquer bandido. A herança histórica dos
brasileiros é recheada de canalhice, negociatas, sandices, megalomanias,
mentiras, usurpações, corrupções, golpes de Estado, que por mais que
historiadores procurem alguma dignidade, a mesma nem ao menos é um termo do
vocabulário ordinário, quanto mais algum tipo de prática ou mesmo teoria, tendo em
vista que o que moveu o desenvolvimento nacional sempre foram interesses
mesquinhos, econômicos e as circunstâncias que obrigam os brasileiros a terem
que revisar seus pontos de vistas sempre arcaicos, meras cópias mal feitas de
ideias importantes, mas que poucos entendem – falta cultura, falta formação! Se
pudesse fazer uma hierarquia entre as merdas nacionais, o que é certo absurdo,
pois seja bosta, coco, fezes ou excremento, trata-se, sem dúvida, sempre de
merda, um termo rude ou rústico, é verdade, mas honesto e verdadeiro, e muito
mais próximo da realidade nacional, onde excremento é um termo tão sofisticado,
que nem professores universitários o utilizam, além de soar falso aos ouvidos
surdos dos nacionais, diria, então, que uma das coisas mais fedidas que temos é
as leis, um excremento só. Em primeiro lugar, ninguém ou quase ninguém em solo
brasileiro, e sendo brasileiro, gosta de lei – burlar é quase um esporte
nacional, com certeza, uma prática usual; todos ou quase todos, por arrogância
ou ignorância, acham que as mesmas servem aos demais, nunca para eles próprios
ou para aqueles que consideram seus. Em segundo lugar têm a petulância de
querer mudar a barbárie nacional por decreto, quando os hábitos e os costumes
só muito lentamente podem ser mudados, quando são mudados, o que nem sempre
ocorre. Em terceiro lugar querem abranger tudo e tudo escapa pelo excesso de
regulamentação que se contradiz ou se opõe, ou nada especifica de fato, e tudo
se resolve pelo burocrata que interpreta a norma como bem entende. Entre o que
a lei impõe, o que o governante ordena e o que o funcionário público faz são
coisas tão distintas, que qualquer cidadão sabe que quem de fato resolve seu
problema, é aquele amigo que conhece alguém na repartição que fará tudo
acontecer como tem direito (ou não), mas que ninguém está disposto a
realizá-lo, a não ser que seja conhecido de alguém da repartição ou instituição
que presta o serviço. Diria que em termos políticos os brasileiros são
pré-políticos, acreditam mais nos homens do que nas leis, votam mais nas
pessoas que nas ideias, e se pudessem seriam monarquistas, só não são para não
ser a única excrescência das Américas. Na verdade, a mentalidade brasileira é
de Estado absolutista, que deve resolver tudo, que deve fazer leis, executar o
direito, guardar a economia, resolver as pendengas de todos e acolher a todos
diante dos cataclismas. Os brasileiros valorizam mais a beleza que a
inteligência, mais o bolso que o caráter, mais o sabido que o sábio, mais o
esporte que a política, mais a arte que a ciência, mais o mito que a filosofia,
mais a aparência que a essência, mais o conhecimento prático e a utilidade
imediata que a sabedoria teórica e de caráter formativo, que não visa um fim
imediato, mas aquisição de certo refinamento no pensamento. A grande
contribuição para a humanidade dos brasileiros, além do samba e da cachaça, é o
fato de serem medíocres e não fazerem grandes coisas, o que evita grandes
erros, e sua atuação na arena internacional é pífia, como são seus políticos,
não contribuindo para grandes cagadas mundiais; quase toda nossa merda é
absorvida internamente. Externamente temos a petulância se sermos uma potência,
ainda que acrescentem o sofisma “emergente” após potência, que se sabe, não é
levado a sério, pois concretamente somos uma nação pouco confiável, onde os
contratos podem ser rompidos por mudanças intempestivas das leis, sempre
prontas para mudanças segundo a força dos interesses que as promovem. Não há
diálogo ou debate, e qualquer manifestação de ideia, se desqualifica o
idealizador antes de se entrar no mérito do idealizado. A democracia é
entendida como uma tirania da maioria sobre as minorias e que a escolha do
governante resulta na liberdade de escolha da tirania a que se quer se
submeter. A aquisição de riqueza ou bens resultam mais numa ostentação de sua
posse do que em algum tipo de aprimoramento pessoal e, de forma alguma social, e
a aquisição de conhecimento em posse de instrumento de manipular e enganar a
grande maioria, carente não apenas de conhecimentos, pois que isso até mesmo a
elite é, mas também portadora de uma ignorância secular, e, portanto,
facilmente manipulável por qualquer espertalhão. Fundamentalmente, o brasileiro
tem preço, e é barato, porém, pouco valor.
Ao afirmar
isso pode parecer que tenho certo menosprezo pelos brasileiros, entre os quais
me encontro. Longe está da verdade. Há algo que admiro e que certamente deve
ter influído sobre os fundamentos metafísicos da minha filosofia intestina, a
desimportância dos brasileiros no cenário internacional e a vagabundagem brasileira (cantada em versos e contada em prosa desde o início de
sua ocupação) e que sempre foi severamente reprimida pelas autoridades oficiais
e econômicas, quando não pela própria família, que não poucas vezes tem que
carregar nas costas um ou vários folgados que habitam as famílias brasileiras.
Verdade que as autoridades são essencialmente vagabundas, mas cobram de nós
esforços, para que elas próprias não tenham. De fato, conheço poucos que, se
pudessem, não viveriam à custa de alguém ou do Estado, e como são tantos a ter
a mesma ideia, poucos de fato realizam, ainda que queiram. Nisso vejo alguma
sabedoria, todos querem antes um emprego do que um trabalho, mais o salário que
o esforço para obtê-lo, o único problema é que isso é feito de forma desonesta,
como é a prática nacional. E a desonestidade, não a vagabundagem, é o que onera
a vida de todos, pois paga-se caro para se garantir os bens, que a rigor nunca
estão de fato garantidos, que podem ser usurpados em ardilosas artimanhas, pois
que aqui, dependendo dos recursos econômicos que se tenha e do arsenal jurídico
que se utiliza, tudo pode ser transmutado diante do juiz: nem as leis são muito
honestas nesse país. A preguiça que é algo comentado e relatado desde o que se
intitulou a “descoberta” (ocupação) do Brasil, que dá o suporte ontológico para
a vagabundagem nacional, deveria ser desenvolvida e aprimorada, porém realizada
honestamente, e não como se faz, sempre em prejuízo de alguém ou de vários.
Deputados, governantes, juízes e tantos outros folgados que rondam as manchetes
nacionais deveriam ser privados de seus privilégios, para que mais pessoas
possam folgar também. Ora, se há uma coisa que nossas leis fazem é garantir
privilégios as diversas categorias, proporcionalmente à sua força política
diante da sociedade covarde. Enfim, esta preguiça tão salientada nos trópicos
pelos experientes europeus, tão necessária para uma vida digna num clima por
vezes tórrido, deveria ser levada mais a sério, e ao invés de trabalharmos para
sermos uma potência medíocre, ser um país que antes de aparecer diante dos
demais, satisfaz o mínimo necessário para os que aqui perambulam e habitam. A
verdadeira riqueza natural só é útil, se nos faz trabalhar menos, e aqui se tem
tantas frutas, o que permite desfrutá-las o ano inteiro, sem muito esforço. De resto, vejo que os países podem se organizar sob círculos virtuosos ou círculos viciosos, e a qualidade dos círculos depende da qualidade dos cidadãos; onde se tem mais virtude, há menos violência e menos custos para se viver, onde se tem mais vício, há mais violência e o custo social é maior. O brasileiro se estrutura através de círculos viciosos, que datam do tempo colonial, com clientelismos, paternalismos, cumplicidade e troca de favores, onde as relações pessoais são mais importantes que as competências individuais, e o bem público uma apropriação privada dos setores sociais mais fortes da sociedade brasileira; a repartição de honras e punições atendem critérios de relacionamentos, e quanto mais distanciado estiver dos portadores desse poder, tanto mais distante estará da honra e mais próximo estará da punição. Naturalmente, para os cidadãos comuns, como eu e a grande maioria, que nada fazemos e assim nada podemos para alterar os vícios que sustentam a sobrevivência viciosa dos brasileiros, que passamos despercebidos das autoridades e da imprensa, e temos uma vida normal, ou seja, sem glória ou fama, podemos levar uma vida bem razoável no Brasil, afinal há pessoas divertidas, há muita coisa para ser vista, criamos relações que nos sustentam num mar de barbárie social, pois aqui se mata mais por menos, e a vida é uma banalidade que assistimos esvair nos telejornais diários. Dizem os mitos que a câmera inibe a criminalidade, entretanto, desde que se tornaram usuais, só tenho assistido a roubos e mortes, sem observar nenhuma diminuição, pelo contrário, assisto alarmado a sua ampliação e amplidão. Eu mesmo já sofri várias tentativas de roubo, e só não fui roubado porque nada tinha (ou tenho) para ser roubado, pois praticamente só tenho o que trago dentro de mim, algumas ideias, várias emoções, alguns parcos conhecimentos e uma tênue vontade de continuar vivo, e nem sei direito por que. Talvez, porque eu mesmo ainda não tenha feito uma grande cagada e apenas cagado aqui ou ali moderadamente, como a grande maioria, que se não traz grande contribuição para a vida pública, também não promove enormes disparates públicos.
Poderiam legitimamente perguntar se não haveria pessoas que escapam desse diagnóstico, ou até mesmo se eu estaria imune a essa mediocridade brasileira que descrevo. Creio que sim, aliás, eu me considero quase imune à barbárie local, conseguindo conviver razoavelmente de forma pacífica nesse mar de mesquinharias e violências; além disso, conheço gente sábia e justa por aqui. Todavia, somos tão poucos e a sabedoria é tão difícil de ser absorvida pelos locais, assim como o bom senso tão escasso, e a disposição para agir assim como a coragem para a ação tão raras, que suas existências passam despercebidas, quando não são tidos por tolos quem possui tais qualidades; é que num universo de ignorância generalizada, independente da classe social, a sabedoria dificilmente é reconhecida, e o sabido reina soberano sobre os vulgos. E a merda nem é tanto não saber, mas antes a forte aversão a saber. Eu que não espero grande coisa do futuro, visto que o passado é medíocre e o presente igualmente, aguardo apenas o passar dos dias para assistir antigas cenas se repetir e, dentro das minhas limitações, sofrer o menos possível com a barbárie dos demais e tomando cuidado para não pisar na merda que vejo espalhada por toda parte.
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